terça-feira, 16 de abril de 2024

Ocidente tenta criar um novo “caso Guaidó”

Talvez achando que a insistência pode compensar a falta de competência, as corporações midiáticas, ONGs e governos atlantistas decidiram tentar inventar um novo “caso Guaidó” na Venezuela.

Conforme versa a narrativa ocidental, Nicolás Maduro estaria impedindo a sua “principal rival”, Maria Corina Machado, de disputar as eleições para poder se manter no poder por tempo indeterminado como “ditador”, com eleições de “faz de conta”, no contexto das eleições presidenciais a serem realizadas em 28 de julho desse ano.

A acusação é reminiscente das acusações lançadas contra Putin em relação a Navalny, e a ideia parece ser dar a entender que Maduro disputará as eleições sozinho. Na verdade, porém, 13 candidatos à Presidência se qualificaram e se inscreveram para disputar o cargo máximo venezuelano, apoiados por 37 partidos; ademais, todos os candidatos, exceto Maduro, são da oposição venezuelana.

De fato, o principal partido da oposição, o “Un Novo Tiempo”, inscreveu Manuel Rosales, governador de Zulia, como candidato à presidência sem qualquer problema. Todo o resto da oposição conseguiu também inscrever os seus candidatos. Esse é um ponto relevante porque, na verdade, o Un Novo Tiempo é precisamente o partido de oposição com mais bases concretas em termos de cargos eleitorais.

É um tanto quanto peculiar, inclusive, que Maria Corina tenha atacado Rosales como “traidor” por ter lançado a própria candidatura. Se o interesse fosse, realmente, de disputar eleições contra Maduro e derrotá-lo nas urnas, o lógico não seria apoiar o opositor mais experiente e com maior base de apoio? Não foi isso que Maria Corina fez, de modo que claramente há algo suspeito aí.

A inabilitação da Maria Corina para disputar as eleições já era esperada, não trazendo qualquer surpresa ou novidade. Apesar dela ter, supostamente, ganho as primárias da oposição em 2023 (supostamente porque houve acusações graves de fraude eleitoral por parte de outros setores da oposição), já havia contra ela um processo por causa do seu envolvimento nas conspirações de Juan Guaidó contra a Venezuela, inclusive com condenação em 1ª instância, impedindo-a de ocupar cargo público.

Guaidó é um personagem tão insignificante que quase já esquecemos da existência dele. Mas por algum tempo, a partir de 2019, ele se disse “Presidente da Venezuela” e foi reconhecido como tal por países atlantistas e seus aliados, depois que a OEA acusou a Venezuela de “autogolpe” por causa da suspensão das prerrogativas e poderes parlamentares pelo Tribunal Supremo da Venezuela por causa de atos de desacato da Assembleia Nacional.

Poderia ser tudo apenas uma pantomima se isso não tivesse tido uma série de repercussões complicadas que agravaram a crise venezuelana: a principal das quais tendo sido o confisco dos ativos da CitGo e da PDVSA no exterior em 2018, por “ordem” de Guaidó, bem como a apropriação do ouro venezuelano armazenado em Londres em um conflito que se estende de 2018 até agora.

Em tudo isso, bem como na campanha traiçoeira por sanções e embargos contra a Venezuela, a Maria Corina participou ativamente, de maneira aberta, como uma das principais aliadas de Guaidó, o que ela tem sido há mais de 10 anos.

Sem surpresa para ninguém, desde o primeiro governo Chávez, Maria Corina Machado tem sido uma ongueira financiada pelo NED dos EUA, através da ONG Súmate, que inclusive participou na tentativa de golpe contra Hugo Chávez em 2002. Ela tem sido, ainda, bastante destacada e promovida pelo Fórum de Davos como “o futuro da Venezuela”, o tipo de narrativa que sempre ouvimos quando os globalistas têm algum projeto especial para determinado país.

Ela foi, ademais, entrevistada diversas vezes ao longo dos últimos 10 anos, a mais recente sendo em fevereiro de 2024, pelo Atlantic Council um dos principais laboratórios de ideias dedicados à promoção do atlantismo ao redor do mundo, amplamente financiado pela Fundação Rockefeller, pelo Banco Goldman Sachs, pela corporação ucraniana Burisma (ligada a Hunter Biden e possivelmente implicada nos atentados terroristas do Crocus City Hall), e outros doadores. Além da entrevista, Corina tem recebido bastante destaque nas publicações virtuais do Atlantic Council.

Na prática, além do caos institucional, que acarretou em diversas mortes e destruição do patrimônio público, graças à agitação nas ruas e ao vandalismo planificado no auge da crise política venezuelana, a “militância” de Maria Corina gerou danos patrimoniais em um total de 32 bilhões de dólares a seu próprio país.

A confirmação da condenação judicial à inabilitação para ocupar cargos públicos saiu em janeiro desse ano. De modo que não houve aí qualquer irregularidade. Seria possível até mesmo especular se a insistência de Maria Corina em disputar as prévias apesar de já estar inabilitada a ocupar cargo público não teria sido um plano para alegar perseguição e repressão após a impossibilidade óbvia de disputar as eleições. Mas depois veio uma encenação ainda mais amadora, o da substituta indicada por Maria Corina Machado, Corina Yoris.

Inventou-se uma “sabotagem” inexistente que estaria impedindo Corina Yoris de registrar a sua candidatura. A narrativa é que o governo estaria causando bugs propositais que a impediriam (e apenas ela) de se candidatar pelo sistema eletrônico comumente usado.

A realidade é mais simples. Quem tem que registrar candidato é o partido que o candidato estará representando. Corina Yoris, aparentemente, tentou se registrar por conta própria, o que era impossível. Para ela se registrar por conta própria os requisitos seriam diferentes, e ela não tinha a quota mínima de apoio para se inscrever como candidata independente.

Aliás, nos últimos dias de possibilidade de registro, a Maria Corina Machado pediu aos outros partidos da oposição que abandonassem suas candidaturas e registrassem Corina Yoris como candidata, o que todos se recusaram a fazer.

Para mim, todo esse drama é completamente artificial.

Talvez mais plausível que a simples incompetência, me parece um dramalhão arquitetado para se poder acusar o governo venezuelano de impedir de participar nas eleições a potencial candidata que as pesquisas de opinião, controladas por opositores, dizem que poderia ganhar de Maduro. A prova disso, inclusive, é que seguiram incluindo Maria Corina Machado nas pesquisas de opinião, mesmo depois dela ter sido inabilitada ano passado.

Com isso, se consegue apresentar o caso à OEA e aos países ocidentais para que não reconheçam o resultado das eleições venezuelanas.

O Ministério de Relações Exteriores do Brasil comentou sobre as eleições venezuelanas sem levar em consideração esse contexto e os detalhes técnicos do processo eleitoral venezuelano e das disputas políticas dos últimos 2 anos, o que levou a um mal-estar nas relações entre os dois países parceiros.


Raphael Machado – Editor, analista geopolítico e político, escritor especializado em assuntos latino-americanos.

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