segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021

Empreendedores com sentido de oportunidade ou vampiros?


Enquanto, um esforço de arrecadação de fundos foi liderado pelo Rep. Alexandria Ocasio-Cortez de Nova York para ajudar texanos castigados pela tempestade e levantou mais de US $ 4 milhões em apenas alguns dias, o senador Ted Cruz, representante do Texas, fugiu de Houston para Cancún, no México, enquanto milhões de residentes do Texas estavam sem energia e água potável em meio a temperaturas congelantes que deixaram pelo menos 21 pessoas mortas no sul dos Estados Unidos. Mas nesta crise humana, não existem apenas heróis e covardes, também existem pessoas que sabem fazer uma limonada em qualquer situação terrível.
Os EUA enfrentam a maior temporada de frio dos últimos anos. As temperaturas negativas reduziram para metade a capacidade de produção de energia ao mesmo tempo que o consumo disparou, levando os preços da eletricidade, em Estados como o Texas, a subir mais de 10 mil por cento. Neste momento, mais de quatro milhões de estado-unidenses esforçam-se por manter-se quentes em temperaturas de -10 graus Celsius, durante os cortes de gás e electricidade ordenados pelas agências federais. Outros três milhões deixaram de poder suportar a conta da electricidade e do gás natural.

Somemos a crise social e sanitária: os EUA aproximam-se de meio milhão de mortos por COVID-19 e, numa só semana, 1,1 milhões de estado-unidenses perderam o posto de trabalho, quatro vezes mais que no período homólogo do ano passado. Um cenário que, já avisou a Organização Mundial do Trabalho, pode tomar proporções ainda mais dramáticas.



Mas nem tudo é mau, pelo menos para todos. Um relatório recente do UBS, um dos maiores bancos do mundo, sugestivamente intitulado «Cavalgar a tempestade: a turbulência dos mercados acelera a divergência das fortunas», descreve a pandemia como «um tempo de excepcional destruição criativa schumpteriana» levada a cabo pelos «bilionários destes tempos estimulantes e pioneiros».

Sem conseguir esconder o entusiasmo, o relatório celebra o «sentido de oportunidade» dos 660 bilionários estado-unidenses, de um total de 2189 em todo o mundo, que viram a sua fortuna crescer 40 por cento para um valor total de 4,1 biliões de dólares, o dobro da fortuna detida pelos 165 milhões de estado-unidenses mais pobres, ou seja, metade da população.

Não é um caso isolado: segundo a Oxfam, as 10 pessoas mais ricas do mundo viram a sua fortuna crescer em 500 mil milhões de dólares desde o início da pandemia. Este valor, aponta a organização internacional, seria suficiente para vacinar toda a humanidade e, ainda assim, se doassem apenas o que enriqueceram.

Curiosamente, o relatório da UBS não tem pejo de elogiar a generosidade dos bilionários: desde o início da pandemia, doaram mais de 7,2 mil milhões de dólares à caridade. O que não menciona o relatório é que este valor corresponde a 0,07 por cento da sua fortuna total.


Em qualquer produção de Hollywood, daquelas com super-heróis, se houvesse um grupo de 10 pessoas que, em vez de salvar a vida de milhões de seres humanos, preferisse enriquecer ainda mais, apesar de já não ser possível gastar todo o seu dinheiro, mesmo que vivessem mais cem vidas, chamar-lhes-íamos super-vilões, maus da fita ou monstros. Como é na vida real, chamamos-lhes empreendedores com sentido de oportunidade.

Rejeição da Tática que Subordina o Proletariado à Burguesia

A Crise Brasileira-1966, Carlos Marighella

Coletivo Cem Flores

O proletariado não pode seguir uma tática qualquer. A tática que não convier à conquista dos objetivos estratégicos da revolução antimperialista e antifeudal, nacional e democrática, deve ser repelida.

Toda tática que, na nova situação do país, pretender prosseguir subordinando ideologicamente o proletariado à burguesia é uma tática condenável.

Que essa tática existe não é novidade para ninguém. Ela é o resultado da influência ideológica da burguesia no seio do proletariado.

Torna-se necessário conhecer suas características, para combater sua penetração no meio revolucionário.

Trata-se da tática que se limita a ver a aliança do proletariado com o centro da frente única, e permanece indefinidamente nestes marcos estreitos.

Sua maneira de ser é fruto de uma concepção reboquista, por falta de confiança no proletariado. Seu ponto de partida está em reconhecer que, objetivamente, o processo político brasileiro se desenvolve sob a direção da burguesia. E disso não se liberta.

É a tática que busca uma saída moderada, teme as lutas radicais e uma solução revolucionária, para não desgostar a burguesia e manter com ela uma colaboração duradoura.

A tática a que nos referimos segue religiosamente os cânones teóricos do passado, e não vê possibilidade para o desencadeamento da revolução, a não ser quando existam as condições pré-revolucionárias clássicas. A revolução cubana já pôs por terra este conceito tradicional, mas a citada tática ignora os fatos novos.

No que diz respeito à autocrítica, essa tática não parte de um ponto de vista de classeRejeita a ideia de que a causa principal do erro dos comunistas, anteriormente, foi a ilusão na liderança da burguesia. Recusa-se a admitir que ficamos basicamente sob a liderança da burguesia e a seu reboque, e perdemos a autoridade sobre as massas, dando-lhes a falsa ideia de que estávamos no poder e éramos a mesma coisa que João Goulart.


Em consequência da subordinação ideológica à burguesia, acabamos caindo na política de apoio aos atos positivos de Goulart e de combate aos seus atos negativos. Isto é errôneo. E o erro consiste — nesse caso — em esperar pelas iniciativas da burguesia. Consiste em nada fazer para sair do conformismo.

Não se trata de recusar a frente única com a burguesia. Mas uma das condições típicas dessa aliança é — de nossa parte — lutar para que a hegemonia seja do proletariado e este não fique a reboque da burguesia.

A tática que combatemos não se preocupa com tais coisas. Seu grande empenho — inspirado na ideia de que somos uma força moderadora — tem outro sentido, visa significativamente a chamar a atenção para o desvio esquerdista.

Na verdade, o esquerdismo foi fruto extemporâneo da ilusão de classe, que não permitia ver a impossibilidade da conquista de um programa avançado, confiando na burguesia, em vez de confiar na luta pela base.

Atribuindo ao esquerdismo a responsabilidade principal por nosso erro, a tática em causa não deixa de desferir alguns ataques ao desvio direitista — pelo menos para guardar as aparências.

O único resultado que consegue — por esse caminho — é dividir as fileiras do proletariado em duas facções — esquerda e direita. Mas não convence ninguém. E o pior de tudo é a fuga ao exame da causa principal de nosso erro, que foi a perda do sentido de classe.

Desistindo de reconhecer que nosso mal maior é tentar prosseguir com o cordão umbilical atado à burguesia, a tática referida teme aceitar como perspectiva básica a derrubada da ditadura pela força.

{…]

Essa tática aceita uma tal saída porque continua alimentando ilusões na burguesia, e espera que, das contradições entre as classes dominantes, surja um desfecho favorável ao povo, sem o apelo a lutas radicais.

Estamos aqui no pleno reinado das ilusões de classe, para não falar num reinado do Dr. Pangloss. Tal ilusão só se explica em virtude da tática que apreciamos acreditar que uma das facções das classes dominantes acabará buscando, ela própria, a ajuda do proletariado, para livrar-se da oposição ou da ameaça de outras facções, também em luta pela supremacia política.

A derrota da ditadura seria, assim, o resultado da luta e da liderança da própria burguesia ou de um setor burguês, que acabaria apoiando-se no proletariado, e evitando o derramamento de sangue ou a luta violenta.

[…]

A questão está no caminho tático, e este caminho consiste em saber qual o elo que levará à derrubada da ditadura, com o emprego da ação de massas e o reforçamento da posição independente do proletariado.

O elo só pode ser o trabalho de campo, a penetração profunda no meio rural brasileiro, a preparação e o desencadeamento das lutas camponesas, com todas as consequências decorrentes das ações que contrariam o imperialismo e o latifúndio.

A tática a que nos reportamos despreza o papel do camponês na luta contra a ditadura, exatamente pelo temor da radicalização do processo político.

Daí porque — ao tratar do programa de lutas — só apresenta reivindicações relacionadas com o nacionalismo, com as liberdades democráticas e os interesses do proletariado. As reivindicações camponesas são omitidas. A luta pela terra é relegada para o momento da luta pelo poder estatal revolucionário.

Esta maneira de proceder indica que a tática em alusão só acredita em lutas urbanas, e isto implica em persistir na ideia de lançar o proletariado à luta sem o apoio do campesinato, como tem acontecido até agora no movimento revolucionário brasileiro. A tática aqui exposta não vê que o camponês é o fiel da balança no Brasil, como em toda a América Latina.

Quanto ao problema das eleições, a tática referida avalia-o mal e erroneamente, porque não confia no proletariado e prosterna-se ante a burguesia e sua liderança.

Todos veem que o caminho da derrubada da ditadura não pode ser por via eleitoral. E esta é uma tese provada pela experiência, eis que a ditadura — valendo-se da força, isto é, dos atos institucionais e complementares — transformou as eleições numa comédia, para não falar em pantomima.

A tática em causa quer, entretanto, que pelas eleições sejam infligidas derrotas parciais que debilitem o regime, apressando sua derrocada. O meio para isto seria o apoio às forças contrárias à ditadura e que mereçam a confiança do povo. Não sendo possível, tratar-se-ia de votar em branco e desmascarar a farsa eleitoral.

Depreende-se daí algo de curioso: a tática que citamos ainda não considera suficientes os instrumentos já adotados pela ditadura que invalidam as eleições e fecham as possibilidades de uma saída eleitoral, com a participação e a vitória de candidatos da confiança do povo. E isto é evidente, desde que — como tal — não podem ser classificados senão os candidatos aceitos pela ditadura ou com ela comprometidos. São estes, aliás, os únicos aptos a escapar das cassações e de outras leis e métodos fascistas.

Esperar que das eleições convocadas pela ditadura surja a possibilidade de infligir-lhe derrotas parciais, debilitar o regime, apressar sua derrocada e retomar o processo democrático — sem o persistente trabalho para desencadear lutas e chegar assim ao efetivo desmascaramento do atual governo — significa impelir o povo para o beco sem saída das ilusões eleitorais. O que levará o proletariado e as massas a navegarem ingloriamente nas águas dos candidatos da ditadura, ou dos que pretendem salvar a quartelada de abril, depois que sentiram na própria carne a repulsa do povo ao governo e sua política.

A tática que mencionamos não oferece melhor solução em face do problema sucessório, e levará o movimento revolucionário a outra estrondosa ilusão ou à estagnação no charco da pusilanimidade burguesa.

Em referência às crises de governo, a tática em pauta firma posição partindo do fato que novos golpes podem ocorrer.

A possibilidade de novos golpes é real. Mas a tática citada quer — nesse caso — a intervenção das forças populares para impedir uma “solução reacionária” com o fortalecimento de Castelo, ou a substituição de golpistas.

Tal posição demonstra que essa tática não julga Castelo suficientemente reacionário nem bastante forte, o que, entretanto, poderia vir a acontecer com o golpe. A outra alternativa para uma “solução reacionária” — ainda segundo a mesma tática — seria a subida de novos golpistas ao poder.

O fundamento ideológico dessa posição tática é norteado pela ilusão na situação atual e pela esperança na sobrevivência de uma reviravolta da própria burguesia, reviravolta destinada a pôr em ordem a situação política e ensejar uma escalada democrática.

Em resumo, as características e os aspectos da tática a que aludimos mostram que o proletariado nada tem a fazer com ela e que — se porventura viesse a cometer o equívoco de adotá-la — continuaria perplexo e vagueando por aqui e por ali, sem orientação em face dos constantes atos institucionais e complementares dos militares empoleirados no poder.

Eis porque o combate à subordinação ideológica do proletariado à burguesia e, em consequência, a rejeição de uma tática baseada nesse princípio constitui um elemento fundamental para levar-se a bom termo a luta pela derrubada da atual ditadura.



sábado, 13 de fevereiro de 2021

Recado de Miguel Ángel Asturias para um bolsominion


…Alumbra, lumbre de alumbre, Luzbel de piedralumbre!

Assim começa O Senhor Presidente, obra fundamental da literatura latino americana, da qual procedem  ao mesmo tempo o realismo mágico e os grandes romances políticos sobre as ditaduras que causaram tanto sofrimento e destruição por todo o continente, como     Eu, o Supremo do paraguaio Augusto Roa Bastos e O outono do patriarca do colombiano Gabriel Garcia Márquez.

O livro teve uma longa gestação, foi escrito entre meados dos anos 20 e início dos anos 30 do século passado por Miguel Ángel Asturias em Paris, onde se auto-exilou por mais de dez anos fugindo  da ditadura de Estrada Cabrera em seu país de origem, a Guatemala. À ditadura de Estada Cabrera, que durou de 1898 até 1920, sucedeu-se a ditadura de Jorge Ubico, o que fez com que o livro só fosse publicado em 1946, no México, ano em que também se publicou no Brasil o primeiro livro de um outro escritor fundamental: Sagarana  de João Guimarães Rosa. Os caminhos desses dois escritores se cruzariam em 1965, quando se realizou em Gênova o Congresso de Escritores Latino-Americanos e foi criada a Primeira Sociedade de Escritores Latino-Americanos, com Miguel Ángel Asturias e João Guimarães Rosa na sua direção. Em um intervalo durante este congresso em Gênova, Guimarão Rosa concedeu uma famosa entrevista ao crítico de literatura alemão Günter Lorenz , na qual fez um interessante comentário sobre Asturias ao responder a uma pergunta:

Guimarães Rosa: Acho que você me entendeu mal. Aparentemente está se referindo ao que aconteceu em Berlim. Acerca disto queria dizer que estou do lado de Asturias e não de (Jorge Luis) Borges. Embora não aprove tudo que Asturias disse no calor do debate, não aprovo nada do que disse Borges. As palavras de Borges revelaram uma total falta de consciência da responsabilidade, e eu estou sempre do lado daqueles que arcam com a responsabilidade e não dos que a negam.

Esta citação é muita curta, não contém muitas informações sobre o contexto,  mas ainda assim me parece suficiente para indicar que Guimarães Rosa reconhecia em Asturias um escritor com quem compartilhava  uma mesma posição: ambos assumiam a responsabilidade do escritor diante de sua época. 

Regime dos Psicopatas. Bolsonaro Promete Respeitar a Constituição
"O patriotismo é o ato de cantar um hino e usar as cores da bandeira, não o vermelho da Rússia"

Em O Senhor Presidente , Miguel Ángel Asturias confrontou a sociedade, a política e a literatura da América Latina de seu tempo como nenhum outro havia feito até então. Para o estudioso da literatura Latino-Americana Gerald Martin, autor do influente livro Journeys through the Labyrinth: Latin American Fiction in the Twentieth Century , trata-se de um romance único na literatura Latino-Americana, o primeiro a ‘combinar sua chamada à revolução na linguagem e na literatura com uma chamada à revolução social e política e o primeiro a desmascarar o autoritarismo e o patriarcalismo ao nível da consciência, ou seja, da interiorização do totalitarismo.’ 

Relendo O Senhor Presidente hoje, enquanto o Brasil sucumbe à incompetência generalizada, à corrupção desenfreada e à ignorância voluntária de uma parte significativa da população, reconheço muito em comum entre nosso país e o mundo descrito por Asturias em seu romance,  o de uma sociedade sofrendo sob  uma ditadura militar mesquinha e violenta. E diante das ameaças do Senhor Presidente Bolsonaro de um golpe de estado  e do estabelecimento definitivo de uma ditadura, o romance de Miguel Ángel Asturias se revela uma mensagem, uma advertência sobre o que ainda pode se transformar o nosso país. Porque tudo pode, sempre, piorar: o poço não tem fundo, nem limites a estupidez.

Uma personagem do romance, o General Canelas, cai em desgraça junto ao Senhor Presidente e tem que fugir da ditadura militar que ajudou a impôr. E durante a fuga pelo interior do país, confrontado pela miséria que o governo ditatorial tinha criado e que até pouco tempo atrás era invisível para ele, escondida que estava pelos privilégios de que ele desfrutava, pensa consigo mesmo:

Qual era a realidade? Não ter  pensado nunca  com a sua própria cabeça, ter pensado sempre com o quepe . Ser militar para manter no comando uma casta de ladrões, exploradores e traidores egoístas (…).

Quem tiver ouvidos, ouça. Quem tiver olhos, veja.

Num outro episódio do romance, uma empregada de um comandante da polícia recebe a solicitação de uma mulher humilde que apenas quer saber onde foi enterrado seu marido assassinado nos cárceres da ditadura. A empregada promete ajudar e fala com o comandante da polícia, que responde deste modo:

Não tem que dar esperanças. (…) A gente permanece nestes postos porque faz o que lhe é dito e a regra de conduta do Senhor Presidente é de não dar esperança e de pisoteá-los e espancá-los a todos porque sim.

Diante dos milhares de mortos pela pandemia do COVID 19, diante da destruição da floresta amazônica e do pantanal, como não ver nestas palavras a descriçâo exata da condura do Ministro Pazuello, do Ministro Salles e de tantos outros em cargos importantes do governo do Senhor Presidente Bolsonaro?

Quem tiver ouvidos, ouça.   Quem tiver olhos, veja.

Miguel Ángel Asturias

E diante da inércia de grande parte da classe política, incapaz  de tomar uma atitude diante de tanto descalabro, mortes e destruição, sem nenhuma vergonha de seu próprio oportunismo, estas palavras escritas por Asturias e ditas por uma  personagem do romance, parecem sair da boca de milhões de brasileiros:

Não há esperança de liberdade, meus amigos; estamos condenados a suportá-lo até que Deus queira. Os cidadãos que ansiavam pelo bem do país estão longe (…) As árvores já não dão frutos como antes. O milho já não alimenta. O sono já não descansa. A água já não refresca. O ar torna-se irrespirável. Às pragas seguem as pestes, as pestes às pragas e não tarda virá um terramoto para pôr fim a tudo isto. (…) Para onde virar os olhos em busca de  liberdade?

Miguel Ángel Asturias, prêmio Nobel de Literatura de 1967, desde seu pequeno e sofrido país manda sua mensagem para o Brasil de hoje. Há que ler O Senhor Presidente. Resistir e buscar forças nas palavras encantatórias do romance. Volto ao seu começo:

Alumbra, lumbre de alumbre, Luzbel de piedralumbre, sobre la podredumbre! Alumbra, lumbre de alumbre, sobre la podredumbre, Luzbel de piedralumbre!Alumbra, alumbra, lumbre de alumbre…, alumbre…,alumbra…, alumbre de alumbre…,alumbra,alumbre…! 


quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

Exposição Consciência apresenta ilustrações do artista peruano Ivan Ciro Palomino



Ivan Ciro Palomino, ilustrador peruano

Palomino fez história ao ficar em primeiro lugar no concurso “Pôster para a Paz”, realizado pelo escritório da ONU para Assuntos de Desarmamento. A competição foi realizada em comemoração aos 70 anos da primeira resolução da Assembleia Geral da ONU.


Atualmente o Centro de Informação das Nações Unidas para o Brasil (UNIC Rio) apresenta a exposição Consciência, que traz ao Rio de Janeiro ilustrações do artista peruano Ivan Ciro Palomino.

A mostra promove uma reflexão sobre os desafios globais da atualidade e ficará em cartaz no CasaShopping de 21 de janeiro a 21 de fevereiro, dentro da loja conceito da UIA2021RIO EXPO - espaço para divulgação da feira oficial do Congresso Internacional de Arquitetura, que ocorrerá no mês de julho, no Píer Mauá, no Porto Maravilha.

Endereço

Av. Ayrton Senna, 2.150. Barra da Tijuca
Rio de Janeiro - RJ - CEP: 22775-900
Entrada também pela
Av. João Cabral de Melo Neto (Av. Via Parque)

Ivan Ciro Palomino é um artista visual peruano que usa ilustrações para provocar reflexões sobre questões sociais, ambientais e de cidadania. Sua exposição, “Consciência”, discute, por meio de 21 obras, temas como igualdade de gênero, consequências da guerra, refugiados, preservação da natureza, falta de água, entre outros.

“A imagem é essencial para entender, refletir e abordar temas importantes. Cada trabalho pode transmitir emoções sem a necessidade de adicionar um texto para uma maior compreensão”, explica.

Seu trabalho é reconhecido em várias partes do mundo. Em 2016, ele foi premiado pela Organização das Nações Unidas (ONU) no concurso “Um cartaz para a paz”. Em 2017, ganhou em duas categorias na premiação “17 objetivos para transformar nosso mundo”, da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). “A arte focada de maneira criativa nos permite ver o problema e nos questionar sobre como resolvê-los, como encontrar soluções diversificadas”, acrescenta. 

Leonardo Valle - Confira uma entrevista exclusiva com o artista



sexta-feira, 5 de fevereiro de 2021

OS RUSSOS, O DEM , O MDB E A ESQUERDA QUE ACREDITOU NA DIREITA

A história é provavelmente fictícia. Uma das muitas lendas que foram criadas ao longo dos anos em torno do craque Mané Garrincha.
Dizem que às vésperas do jogo decisivo contra a URSS na Copa do Mundo de 1958 o treinador Vicente Feola expunha numa preleção aos jogadores uma elaborada e complicada estratégia para enfrentar o selecionado soviético.
Em dado momento, Mané, do alto de sua simplicidade – ou de sua malícia nem tão ingênua – teria perguntado ao “professor” se ele já havia combinado tudo aquilo com os russos.
A expressão “combinar com os russos” passou a representar no anedotário – futebolístico ou não – todo tipo de estratégia altamente complexa sem qualquer respaldo na realidade. Medidas unilaterais que são tomadas com a expectativa que tudo irá conspirar a nosso favor. E que frequentemente naufragam. Por que “os russos” - ou o DEM, ou o MDB – não estão nem aí para os nossos planos.

Vejam o que ocorreu na eleição para a presidência da Câmara dos Deputados: muito se falou de uma “frente contra Bolsonaro” e “em defesa da democracia”. Muita gente também se se empolgou. Afinal a frente uniria a direita, a centro-direita e a esquerda. Alguns já viam nessa frente um ensaio de uma grande frente – encabeçada, é claro, por um nome de “centro” – capaz de derrotar o Capitão em 2022.
A “Folha de São Paulo”, entusiasmada, atacava o PT por seu “radicalismo”, por relutar em participar dessa veneranda frente. Ciro Gomes idem. Até o PSOL estava dividido, com alguns deputados dessa sigla defendendo o candidato da suposta frente, o emedebista de São Paulo, Baleia Rossi.

Rodrigo Maia, articulador da candidatura de Rossi, presidente em exercício da Câmara, contabilizava os votos e era saudado como o grande articulador e grande estadista...
Só que não!
Como na anedota esportiva, faltou combinar com os russo. Ou melhor, com a direita. O DEM, capitaneado por ACM Neto, abandonou Maia, do seu próprio partido, e seu candidato Baleia Rossi. O MDB, essa praga fisiológica que assola o país, idem. 
No final, todos compuseram com o Capitão e apoiaram seu candidato Arthur Lira. Ou seja, tiraram a escada, para citar outra anedota velha, e deixaram Maia, a mídia pós-golpista - aquela que “descobriu” agora que o Bozo fascista é tão feio quanto pintam! – e os esquerdistas moderados, que acreditam no sistema, segurando a brocha. Como a lei da gravidade não está sujeita a conchavos e compras de voto, todos caíram. Alguns de quatro em posições pouco lisonjeiras!
Alguns bípedes pertencentes à esquerda institucional esquecem constantemente qual é o seu papel na vida, no parlamento e na luta de classes. Algumas dessa aves de bela plumagem rugiram nas redes sociais – onde posam de feras feridas! - tentando desqualificar o PSOL, que apesar de algumas inexplicáveis hesitações, apoiou a candidatura de Luiza Erundina. Atitude deveras louvável, diga-se de passagem. Se é para ser derrotado, que pelo menos seja de pé e não de joelhos mendigando o apoio da direita ou vergonhosamente de quatro.
Só para constar: Arthur Lira amealhou 302 votos. Baleia Rossi, o candidato da tal “frente”, 145. Erundina teve 16. Não seria mais digno uma candidatura única do campo da esquerda, que perderia, é claro, mas mostraria à sociedade quem realmente luta contra o fascismo, a corrupção e o fisiologismo?
Em tempo: estou até agora esperando uma boa explicação do PT para o apoio na eleição do Senado de Rodrigo Pacheco, o mesmo candidato do Capitão. Quanto aos demais partidos que o apoiaram não espero nada. Suas ações lamentáveis já dizem muito!





quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

DEAD PREZ ESTAVA CERTO SOBRE TUDO, MANO!

DEAD PREZ WAS RIGHT ABOUT EVERYTHING - por TIMMHOTEP AKU


Você consegue se lembrar do momento de seu próprio despertar político? Se não for o momento preciso, então a época em que você estava - ou a idade em que você tinha - quando as observações e sentimentos sobre o mundo se cristalizaram em algo mais? Se você é como nós e ama música, todos os pontos essenciais de clareza e realização em nossa vida podem ter uma trilha sonora.

No meu caso, “Slowly, Surely”  de Jill Scott me lembra do meu primeiro desgosto. "All That I Got Is You" de Ghostface me lembra do amor da minha mãe. “Through The Wire” de Kanye me lembra da ambição juvenil e de conseguir meu primeiro emprego. Mas quando penso em meu próprio despertar político - uma constatação de que não apenas havia algo errado com a forma como a sociedade trata os afrodescendentes, mas que poderíamos fazer algo a respeito - penso em Let’s Get Free.


Lançado em 14 de março de 2000, o debut de 18 faixas da dupla Flórida / Nova York de stic.man (Khnum Ibomu) e M-1 (Mutulu Olugbala), é uma obra de arte como propaganda, destinada a provocar e inspirar. 

Mas para minha mente jovem, Let's Get Free tornou-se um guia para o mundo visto através de lentes politicamente educadas, pró-negras e pró-classe trabalhadora, e uma ferramenta para desafiar tudo em que fui doutrinado por minha educação formal e a mídia que consumi.

O álbum  Let’s Get Free é tão presciente do zeitgeist que veio, como foi um exame sóbrio da história e do mundo de seu tempo. É comum ver críticas ao capitalismo na esfera pública - invocar os males deste sistema econômico não é mais um tabu dominante - mas não era naquela época. Em 1998, enquanto o hip-hop se inclinava para o consumo conspícuo e o excesso de aspiração, dead prez lançou pela primeira vez o single “Police State”, stic.man foi ao cerne da questão quando propôs que “organizássemos a riqueza em uma economia socialista.” Foi uma faixa mortalmente séria que abordou os tópicos da violência policial, militarização e vigilância do estado, anos antes de haver um Patriot Act, ou os departamentos de polícia regularmente exibiam equipamentos de nível militar para reprimir protestos, como fizeram em Ferguson.

Let’s Get Free começa com "Wolves", um discurso apaixonado do presidente do Movimento Uhuru, Omali Yeshitela, um ativista de longa data, bem como stic e o antecessor ideológico do M-1. 

O tom é definido com uma alegoria: Yeshitela diz que certos povos indígenas do Ártico têm um método inteligente de matar lobos que rondam. Através do uso de uma faca de dois gumes, com uma lâmina coberta de sangue presa no gelo, o próprio apetite e instinto de sobrevivência dos lobos é usado contra eles e eles são obrigados a se matar. A metáfora explica como viver sob o capitalismo e a supremacia branca prendeu a comunidade negra em ciclos autodestrutivos e nos pede que voltemos nossa atenção para o nosso verdadeiro adversário: “Você não culpa a pessoa, a vítima / Você culpa o opressor! Imperialismo, o poder branco é o inimigo ”, troveja Yeshitela.

Muito antes de "acordar" se tornar uma palavra da moda - e, em seguida, um descritor pejorativo - Let’s Get Free era alternadamente o sol quente da manhã entrando pelas nossas janelas e o respingo de água fria no rosto, nos levando a acordar. Em "They Schools", dead prez fazem as conexões entre a deseducação coletiva dos negros, a criminalização de alunos negros, a tubulação que leva da escola para prisão e como tudo funciona a serviço de nossa opressão. Em "Behind Enemy Lines", stic aborda o encarceramento em massa da perspectiva do preso, enquanto M-1 apresenta aos ouvintes a situação de Fred Hampton Jr., que na época era um prisioneiro político dos dias atuais perseguido pelas mesmas forças que assassinou seu pai Pantera Negra enquanto ele ainda estava no ventre de sua mãe.

A resistência eficaz exige que saibamos quem são nossos inimigos e como se movem - mas também significa que devemos nos preocupar com nosso próprio sustento físico e espiritual. Para esse fim, dead prez nos deu “Be Healthy”, uma música suave com guitarra espanhola na qual eles exaltavam as virtudes da vida vegana muito antes de “dieta baseada em vegetais” fazer parte de nosso léxico coletivo. A linha de abertura “Eu não como carne nenhuma, nem laticínios, nem doces” de Stic está dando tiros, à medida que desaprendemos dietas industrializadas que levam ao diabetes e hipertensão. A simplesmente intitulada “Happiness” nos lembra que a luta pela liberdade requer mais do que apenas lutar - que restauração e recreação também são importantes. “Eu me sinto ótimo, embora tenhamos coisas malucas para lidar / A felicidade está na minha cabeça. Vamos relaxar e encontrar um motivo para sorrir ”, diz o refrão da música. A revolução contra o consumismo é necessária, mas não precisa ser severa. Apesar de seus infames dísticos "croutons" e "futon", a faixa "Mind Sex" é uma expressão da atração sapiossexual que agora está em voga e subversiva, pois abala a ideia clichê de que as mulheres são meramente objetos sexuais tão difundidos no rap.

A poderosa música de protesto desperta a emoção e também a canaliza para a motivação, esta é uma fórmula que dead prez dominou e exibe no hino "I’m A African" "Ei, vire a porra dessa merda pra cima!" diz um stic animado, antes de gritar os gritos de "Uhuru!" e "Koupe tet boule kay!" 

Em seguida, ele e M-1 passaram a nos dar sua marca exclusiva de "hip-hop elegante de dreadlock / foda-se-a-policial" ao invés da batida forte e upbit do produtor Hedrush. Quem diria que o pan-africanismo militante poderia soar tão bem? O sucesso do álbum e a joia da coroa é, claro, a música “Hip-hop”. Com seu baixo vibrante e programação de bateria Dirty South, ele caiu estranhamente em meus ouvidos treinados em boom-bap e G-Funk naquela época. “Hip-hop” era diferente, mas era inegável. A batida inspirou o pulo e as rimas inspiraram o pensamento crítico sobre a música e a cultura que eu amava: “Uma coisa sobre a música quando ela bate, você não sente dor / Os brancos dizem que ela controla seu cérebro / Eu entendo o que acontece, esse é o jogo” diz M-1 em suas linhas iniciais imortais. A música serve como uma introdução à política de dead prez ("Estou na fita para encontrar os crackeiros na prefeitura") e um lembrete para o público do hip-hop ser autodefinido e autodeterminado ("Você prefere ter um Lexus ou justiça? / Um sonho ou um pouco de substância?”).

Ser um fã do dead prez significou ... significa não ter medo de escolher a substância em vez da requinte. O hip-hop nunca se desviou do realismo do dia-a-dia, e o que M-1 e stic estavam abordando em Let’s Get Free o que afetou diretamente a vida das pessoas que criaram a arte e impulsionaram a cultura - inclusive a mim. DEAD PREZ foi direto, sem rebaixar o público ou esnoba-los. Desde o Movimento Black Power dos anos 60 e 70, a necessidade de uma mudança socialista revolucionária não se tornava tão clara para aqueles de nós que não estavam nas torres de marfim da academia ou da intelectualidade política. Este álbum foi o Black Revolution 101 do homem comum. Um plano de dez pontos para o século 21. Ouça novamente e vamos nos libertar juntos.

Dead Prez inspirou AZARIAS, um Rapper com tripla cidadania que vive em um mundo de sensações e vibrações que giram os espectros primitivos que ainda rondam entre Europa, Brasil e Estados Unidos. DEAD PREZ colocar o seu socialismo no que não é valsa vienense, nem tecno, nem rock, metal, nem samba, nem tambores africanos ou uma pajelança amazônica, mas a essência sonora que faz vida. Um Hip hop experimental engajado. Critico, cínico, debochado, que bota o dedo  ideológico na ferida contra o capitalismo e contra o consumismo. Quem quer comprar o capitalismo, claramente quer comprar mui Drogas! Escute sua entrevista no link abaixo.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2021

Dia da Invasão da Austrália negra

Without a Treaty, Australia Day Will Always Be Invasion Day - por Lidia Thorpe

Para os australianos indígenas, 26 de janeiro, o Dia da Austrália nada mais comemora do que a invasão de seus territórios. Embora a campanha Change the Date ganhe impulso, apenas um tratado pode começar a tratar do trauma e do derramamento de sangue do assentamento britânico.

Está se tornando rapidamente uma tradição nacional retornar das férias de verão do Natal e mergulhar de cabeça no debate contencioso sobre a data do “Dia da Austrália”, nosso dia de celebração nacional.

O dia vinte e seis de janeiro é significativo porque marca o aniversário da chegada da primeira frota de navios carregada de condenados ao Porto Jackson. Ele também comemora o governador Arthur Phillip hasteando a bandeira britânica em Sydney Cove. Foi com este ato que a soberania britânica foi proclamada sobre a costa leste da Austrália.


Aquele momento foi uma declaração de guerra ao meu povo, a cultura viva mais antiga do mundo (pelo menos 120.000 anos). É por isso que chamamos o Dia da Austrália de “Dia da Invasão”. Para nós, é um dia de luto.

O lançamento de uma festa nacional em 26 de janeiro é profundamente ofensivo para os Povos das Primeiras Nações da Austrália. Mas isso deveria ser uma afirmação óbvia - o fato de que precisa ser explicado diz tudo o que você precisa saber sobre a negação do passado deste país, tão difundido entre os brancos da Austrália. Também fala do trabalho árduo que ainda precisamos fazer para encontrar uma identidade verdadeira e compartilhada que possa reconciliar os australianos indígenas e não indígenas.

Há um apoio considerável para manter o dia 26 de janeiro como o Dia da Austrália. Mas o suporte é confuso; aqueles que apóiam manter a data dizem que é importante manter a tradição. No entanto, a data só foi observada por todos os estados desde 1946 e passou a ser feriado nacional apenas desde 1994.

Menos da metade dos que responderam a uma pesquisa de 2018 foi capaz de indicar com precisão por que 26 de janeiro é significativo. Muitos sugeriram erroneamente que marcou o dia em que a Austrália foi “descoberta” pelo explorador e oficial naval britânico James Cook - o que não é o caso. A terra, é claro, já estava ocupada por povos aborígenes, mas Cook nem mesmo foi o primeiro europeu a chegar à Austrália; ele foi derrotado pelos holandeses em 1606 e pelos espanhóis no final daquele ano. Além do mais, Cook pisou pela primeira vez na Austrália dezessete anos antes da chegada da Primeira Frota - em abril, não em janeiro.

Dia de celebração nacional, 26 de janeiro está manchado. Não é apenas por causa do debate anual. Pior, a data - bem como a falta de um tratado entre a Austrália aborígene e não aborígene - adiciona um insulto à desvantagem econômica e social que os primeiros povos sofrem em uma das nações mais ricas do mundo. Esta é uma desgraça nacional.

Mudar a data é suficiente?

A falha do governo em seguir seus próprios procedimentos e fornecer cuidados médicos adequados são as principais causas do aumento da taxa de morte de indígenas na prisão.

Nos últimos anos, a campanha “Change the Date” ganhou um ímpeto significativo, gerando debate nacional e recebendo cobertura da mídia em toda a Austrália branca. Se isso, em certo sentido, sugere um despertar nacional, também traz perigos significativos para nossa luta por soberania e justiça.

Uma das primeiras coisas que você notou sobre o debate “Change the Date” é uma ausência flagrante de vozes aborígines. Isso está de acordo com a obsessão que a Austrália (incluindo a Austrália progressista) tem em se preocupar com o chamado “problema aborígine”. Apesar de toda a conversa, isso nunca parece envolver a abertura da conversa para perspectivas, soluções e liderança dos próprios primeiros povos.

Também estamos ausentes do debate porque - sem surpresa - muitos de nós não estamos interessados em ajudar a aliviar a culpa branca mudando a data do Dia da Austrália. Dado o agravamento e as horríveis mortes sob custódia e uma lacuna na expectativa de vida entre homens (indígenas e não indígenas) de até quinze anos, não é uma preocupação urgente. Na verdade, é uma distração perigosa da conversa que deveríamos ter, sobre a assinatura de um tratado entre a Austrália negra e branca.

Não deve ser controverso notar que a Austrália foi invadida e que a guerra e o assassinato em massa foram infligidos às nações aborígenes que viveram aqui por milhares de gerações antes da colonização.

Até 1960, os aborígines eram classificados como animais, não como seres humanos.

Assim como as tribos nativas americanas de todas as 3 Américas, os aborígenes montaram uma resistência heróica contra a colonização. Em ambos os casos, muitos morreram em ambos os lados. Mas em ambos os casos, as fatalidades indígenas foram muito maiores. É por isso que 26 de janeiro marca o início de uma guerra de genocídio racial, cultural e ecológico contra meu povo que continua até hoje.

Enquanto Geronimo e Touro Sentado são líderes relativamente conhecidos da resistência nativa da América do Norte, guerreiros aborígines como Pemulwuy, Musquito e Windradyne são menos famosos. Embora sua bravura em liderar a resistência aborígine fosse igual, suas histórias só agora estão se tornando mais bem documentadas.

Da mesma forma, demorou muito para mapear os locais de massacre em toda a Austrália. O trabalho liderado pela Universidade de Newcastle está corrigindo isso gradualmente - até agora, eles documentaram impressionantes 250 locais entre 1788 e 1930. Os pesquisadores ainda estão contando.

Hoje, não há dúvida de que sucessivos governadores realizaram assassinatos em massa. Isso inclui Lachlan Macquarie, que liderou a transição de Nova Gales do Sul da colônia penal para o assentamento livre. Por exemplo, em 1816, ele ordenou que:

Todos os aborígines de Sydney e para o interior devem ser feitos prisioneiros de guerra e, se resistirem, devem ser fuzilados e seus corpos pendurados em árvores nos lugares mais conspícuos perto de onde caíram, de modo a espalhe terror nos corações dos nativos sobreviventes.

É por isso que o Dia da Austrália, para nós, não é uma celebração. É um dia doloroso de luto.

Um Tratado de Paz, Agora!

Coleção de cabeças de nativos da Nova Zelândia de colonizador britânico em 1895

Sem um tratado, o trauma e o derramamento de sangue que se estendem do nosso passado ao presente não podem ser enfrentados; uma reconciliação duradoura e significativa será impossível. Na verdade, a ausência de um tratado é o maior obstáculo ao crescimento da Austrália como nação. Afinal, todos os outros países da Commonwealth assinaram um tratado com seus povos indígenas.

As instruções escritas do rei George III ao governador Arthur Phillip em 1787, ordenando o estabelecimento da colônia de Nova Gales do Sul, não fazem menção à proteção ou reconhecimento das terras aborígines. Em vez disso, o continente foi colonizado sob a doutrina de terra nullius, ou "terra de ninguém". Apesar do reconhecimento parcial dos direitos à terra dos aborígenes sob a Lei de Título de Nativos de 1993, o conceito de terra nullius continua a moldar a ocupação de nossas terras e recursos.

Um tratado poderia abordar esse mito nacional fundamental e formativo e ajudar a lançar luz sobre um ponto cego trágico. Isso porque, em sua essência, um tratado é um acordo entre soberanos que reconhece a existência e inalienabilidade dos direitos de todas as partes. Outras formas de “reconhecimento”, mesmo que bem intencionadas, não funcionam porque não resolvem esta injustiça fundamental.

Outras mudanças estruturais foram propostas, incluindo o reconhecimento formal e constitucional (no preâmbulo ou corpo) ou o estabelecimento de representação aborígine dedicada para interrogar as implicações da legislação da Austrália apresentada ao parlamento federal (descrita pelos oponentes como uma "terceira câmara") . No entanto, eles são perigosos e prematuros se não forem sustentados por um tratado. Essas medidas, como a alteração da data do Dia da Austrália, precisam ser negociadas como parte de um tratado.

Para um tratado justo, a representação indígena não pode ser escolhida a dedo por autoridades não indígenas. Em vez disso, todos os clãs e nações aborígines da Austrália devem ser consultados com base no consentimento prévio livre e informado, de acordo com a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas (UNDRIP). Após a invasão, havia mais de 250 grupos de línguas aborígenes. Não somos um grupo homogêneo de pessoas. É necessária uma ampla representação para que todos participemos.

Embora seja uma luta longa e difícil para chegar lá, podemos propor alguns princípios-chave para um tratado justo. Como uma litania de exemplos internacionais demonstra, se errarmos, o resultado pode ser um tratado ruim - o que provavelmente seria pior do que nenhum tratado.

Primeiro, o processo do tratado precisa ser uma conversa entre a Austrália negra e branca. É por isso que o conteúdo de um tratado não cabe apenas à Austrália aborígine decidir; criticamente, a Austrália não aborígene deve se perguntar o que gostaria de ver em um tratado com os primeiros australianos. Este diálogo é tão importante quanto o destino, porque moldará o futuro da Austrália e de seus habitantes.

Em segundo lugar, o princípio da autodeterminação deve ser defendido para que a representação aborígine em qualquer órgão de negociação de tratados seja genuinamente representativa e tenha um mandato legítimo das nações ou clãs de onde vêm. As diversas abordagens para tomada de decisão e representação entre o povo aborígine na Austrália devem ser respeitadas. Afinal, ninguém questiona o direito da Austrália não indígena de determinar sua própria tomada de decisão e representação.

Terceiro, como a Austrália ainda é um país da Commonwealth e um tratado só é vinculativo entre poderes soberanos, o povo da Austrália tem duas opções. Ou o país deve se tornar uma república capaz de concluir um tratado com suas Primeiras Nações por direito próprio, ou deve reconhecer que o poder de afirmar um tratado está, em última instância, com a Coroa Britânica. Seja qual for o caso, isso é importante por duas razões. Por um lado, os tratados assinados com poderes não soberanos (por exemplo, governos estaduais) não têm peso suficiente e são muito menos abertos ao escrutínio internacional. Pior, o fato de clãs e nações aborígines entrarem em um tratado com um poder não soberano rebaixa sua própria soberania.

Finalmente, deve seguir rigorosamente os princípios do Consentimento Livre, Prévio e Informado, conforme descrito na UNDRIP.

Melhor nenhum tratado do que um tratado de araque


O governo do meu estado natal, Victoria, foi o primeiro a fazer um tratado com seus primeiros povos. Mas eles falharam em abordar qualquer um dos quatro princípios acima. Isso significa que o Tratado de Victoria não atrai nem credibilidade para os vitorianos de Blak e, portanto, falha em todos os aspectos no que diz respeito à UNDRIP. Mais importante, Victoria não conseguiu aproveitar a oportunidade de usar o processo do tratado para orientar uma conversa que constrói um futuro compartilhado entre Blak e brancos.

O próprio processo foi profundamente falho. A eleição de representantes aborígenes para o órgão encarregado de projetar o tratado, a Primeira Assembleia do Povo, foi uma farsa desde o início, e os vitorianos aborígines sabiam disso. É por isso que apenas 7% dos elegíveis para votar o fizeram. Depois de receber um feedback considerável de anciãos e colegas sobre o processo, me retirei como candidato.

Além disso, alguns clãs aborígines dentro do estado tiveram a representação negada aborígene, enquanto outros representantes deveriam ser escolhidos a dedo por “corporações” aborígenes.

Além disso, negociar tratados com estados e territórios australianos separados em vez da autoridade soberana da Austrália levantou uma miríade de problemas, incluindo questões sobre se tal tratado teria qualquer validade internacional.


Isso é particularmente perigoso porque, como o primeiro estado a iniciar um processo de tratado, Victoria estabelecerá um precedente que informará futuros tratados em outros lugares. Os governos de Queensland e do Território do Norte já estão planejando seguir o exemplo de Victoria.

Em parte, os estados e territórios australianos estão indo por conta própria e desenvolvendo tratados em nível estadual porque as perspectivas de um tratado federal são muito fracas. (Este é o caso mesmo com o primeiro aborígine do país - não branco - Ministro de Assuntos Indígenas.) Mas curto-circuito no nível nacional é uma jogada perigosa.

Até que seja reconhecido e tratado, o trauma e o derramamento de sangue do passado colonial da Austrália continuarão a moldar seu presente. Para romper com isso, a Austrália precisará se transformar radicalmente, para desmantelar as estruturas e mentalidades racistas que persistem hoje e para corrigir a opressão contínua dos australianos indígenas. Sem um tratado, isso ficará incompleto.

Qualquer que seja a forma política que a justiça possa assumir, apenas um tratado assinado com as Primeiras Nações da Austrália fornecerá uma base duradoura para o reconhecimento entre australianos brancos e negros.

Só então será possível resolver o debate anual sobre o dia nacional da Austrália. O dia em que um tratado significativo e válido for assinado com os Povos das Primeiras Nações será o primeiro dia que a Austrália poderá comemorar sem vergonha ou negação.

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