quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

Teoria Monetária Moderna e a crise do capitalismo: Segunda Parte

 

Modern Monetary Theory and the crisis of capitalism: Part Two   

 por Nick Beams


Esta é a segunda parte de um artigo. A primeira parte está disponível aqui.

Historicamente, o ouro emergiu como a matéria-prima do dinheiro. Ao longo do século passado, o dinheiro fiduciário emitido pelo Estado substituiu o ouro no funcionamento diário da economia capitalista e, acima de tudo, de seu sistema financeiro e de crédito, particularmente após a remoção do lastro em ouro do dólar americano em agosto de 1971. Sob essas condições, se desenvolveu a concepção que o dinheiro é meramente uma convenção e deixou de ter uma base material.

Essa é a base da Teoria Monetária Moderna e da promoção de suas ilusões de que o capitalismo pode de alguma forma funcionar de acordo com a satisfação da necessidade social. “Livres das restrições que nos prendem em um mundo de padrão-ouro”, escreve Kelton, “os EUA agora desfrutam da flexibilidade para operar seu orçamento, não como uma família, mas para o verdadeiro serviço de seu povo”. [The Deficit Myth, p. 37]

Ela insiste que “merecemos saber a verdade” de que um governo emissor de moeda “pode se dar ao luxo de comprar o que estiver à venda em sua própria unidade monetária”, e que “os bolsos do Tio Sam nunca estão vazios”. [p. 256]

Ela até mesmo espera o apoio do ex-presidente do Fed, Alan Greenspan, citando o seu depoimento ao Congresso em 2005, no qual disse que não havia “nada que impedisse o governo federal de criar tanto dinheiro quanto ele quer e pagá-lo a alguém”. [p. 182]

É certamente verdade que o Fed pode emitir grandes quantidades de dinheiro sem limite. Mas ele não pode criar o valor que este dinheiro supostamente representa. Ele não pode determinar quanto desse dinheiro precisa ser usado para comprar mercadorias. Além disso, ao emitir dinheiro em papel, não pode expandir a massa de mais-valia adicional extraída da classe trabalhadora no processo de produção, que forma a base e a força motriz da economia capitalista.

Ou seja, ao separar o dinheiro do sistema de valor, a MMT simplesmente coloca de lado as relações sociais subjacentes da economia capitalista. O dinheiro pode ser criado em quantidades ilimitadas. Mas, no limite, seja na forma de ouro ou papel-moeda, ele deve funcionar como o representante material do valor.

Eventos recentes reforçam esse aspecto. A expansão maciça de dinheiro pelo Fed dos Estados Unidos desde o início da pandemia de COVID-19 desencadeou uma crise financeira, viu o valor do dólar cair drasticamente, enquanto o preço do ouro atingiu recordes em meio a preocupações sobre por quanto tempo o dólar pode continuar a funcionar como moeda mundial.


Ao abordar essa questão em um artigo no New York Times no auge da crise de março, o historiador econômico Adam Tooze observou que enquanto a economia americana era fraca, o dólar ainda era o meio de pagamento mais universalmente aceito e uma reserva de valor. Seu argumento era essencialmente circular: o dólar é aceito como meio de pagamento porque é uma reserva de valor e é uma reserva de valor porque é aceito como meio de pagamento.

É impossível dizer quanto tempo isso poderá durar e se a crise atual leva imediatamente a uma crise de confiança no dólar e em todas as moedas fiduciárias e a uma virada para o ouro. Mas há limites inerentes à criação de infinitas quantidades de dinheiro e crédito.

A produção capitalista, com o desenvolvimento do sistema de crédito, Marx observou, “esforça-se constantemente para superar esta barreira metálica, que é tanto uma barreira material quanto imaginária à riqueza, ao mesmo tempo em que volta sempre a bater a cabeça contra ela”.

O dinheiro em forma de metal precioso, insistiu ele, continua sendo a base a partir da qual o sistema de crédito “nunca poderá se libertar”. [Marx, Capital Volume III, p. 708, p. 741]

Keynes pode ter descartado o ouro como uma “relíquia bárbara”, mas os bancos centrais continuam a possuí-lo. O Bundesbank alemão, por exemplo, descreve o ouro como um “tipo de reserva de emergência que também pode ser usada em situações de crise quando as moedas estão sob pressão”, e o Banco da Inglaterra descreve-o como “a última reserva de valor, cobertura de inflação e meio de troca”.

Kelton sustenta que a análise da MMT é apartidária e seu poder explicativo “descreve como nosso sistema monetário realmente funciona”. Isso é falso porque deixa de fora as relações sociais e de classe nas quais a economia capitalista se baseia – a propriedade privada dos meios de produção, a produção de mercadorias para o mercado, a transformação da força de trabalho em mercadoria e a extração de mais-valia com base nessas relações sociais, que é a fonte da acumulação de capital.

Essa separação, que está no coração da teoria do dinheiro da MMT, torna-se ainda mais clara quando Kelton se volta para alguns dos principais problemas sociais e econômicos dos dias atuais e para as propostas apresentadas pela MMT para resolvê-los.

Uma de suas principais diretrizes políticas é a criação de empregos pelo governo federal. Isso significaria a garantia de emprego para todos que quisessem um emprego de US$ 15 por hora, que funcionaria como um estabilizador da economia em períodos de retração econômica. Quando ocorresse uma recuperação, o emprego federal seria reduzido à medida que os trabalhadores retornassem ao setor privado.

É desnecessário dizer que não há explicação para a existência do desemprego, sem mencionar as crises recorrentes e cada vez maiores do sistema capitalista que o produz. Mas a MMT propõe que as crises podem ao menos ser amenizadas através de projetos de trabalho financiados pelo Fed apertando um botão de computador para criar mais dinheiro.

A análise da MMT baseia-se na concepção de que a função da economia é atender às necessidades da sociedade através da produção de bens e serviços, enquanto fornece à população, através do sistema de salários, os recursos para comprá-los e se sustentar.

Essa é uma descrição completamente fictícia. A força motriz da economia capitalista não é a oferta de meios de vida. Sua base é a expansão de valor através da extração de valor excedente, ou mais-valia, do trabalho da classe trabalhadora.

A origem da mais-valia – a base, no limite, do lucro industrial, do aluguel, do pagamento de juros e do retorno ao ativo financeiro – é a diferença entre o valor da mercadoria força de trabalho, adquirida pelo capital através do pagamento de um salário, e o valor criado pelo trabalhador no decorrer do dia de trabalho.

O desemprego não surge de algum infeliz mau funcionamento da economia, mas é parte integrante do processo de acumulação de mais-valia.

Cada setor do capital está em constante luta para apropriar-se de sua parcela da mais-valia total extraída da classe trabalhadora reduzindo seus custos de produção. Uma das principais maneiras de se fazer isso é baixando os salários através da criação do que Marx chamou de “exército de reserva” de mão de obra – os desempregados.



Essa tendência se manifesta continuamente, sobretudo nos períodos supostamente melhores de expansão econômica. À medida que os salários aumentam sob condições de tal expansão, cada setor do capital é impulsionado pela luta competitiva para introduzir novas medidas para reduzir a força de trabalho e intensificar a exploração dos trabalhadores a fim de aumentar os lucros.

Os interesses da classe capitalista como um todo são garantidos pelo Fed, juntamente com outros bancos centrais, que elevam as taxas de juros para suprimir a produção econômica a fim de manter a pressão descendente sobre os salários. No início dos anos 1980, a chamada “reestruturação” da economia americana foi realizada pelo Fed sob a presidência de Paul Volcker, que elevou as taxas de juros a níveis recordes para fechar setores inteiros da indústria e criar desemprego em massa.

O desemprego não é uma característica infeliz ou acidental, mas é parte integrante de um sistema socioeconômico baseado na mercantilização da força de trabalho. Escrevendo contra os proudhonistas e seus “truques de circulação”, Marx observou: “Uma forma de trabalho assalariado pode corrigir os abusos de outra, mas nenhuma forma de trabalho assalariado pode corrigir o abuso do próprio trabalho assalariado”. [Grundrisse, p.123]

A mesma questão – o fato de a MMT passar por cima das relações sociais da economia capitalista – se coloca quando Kelton considera o oferecimento de saúde e outros serviços e infraestruturas sociais vitais.

Contrariando as contínuas alegações de que o Medicare é insustentável, ela escreve: “Todos esses argumentos são mal orientados porque todos estão fundamentados no mito do déficit. Enquanto tivermos prestadores e infraestruturas de saúde para atender à demanda, o Medicare será sustentável nos únicos termos que importam – os verdadeiros recursos produtivos de nossa nação”. [p. 173]

É perfeitamente verdade que todos os recursos existem não apenas para sustentar o Medicare, mas para expandi-lo, juntamente com muitos outros serviços sociais. Mas isso não acontece por causa das formas mal orientadas de pensar dos formuladores de políticas ou dos mitos que acreditam.

Isso acontece porque a estrutura da economia capitalista é baseada na acumulação de mais-valia. Os serviços sociais prestados pelo Estado não produzem mais-valia. Ao contrário, eles são financiados pela redução da massa total de mais-valia disponível para apropriação pelo capital. É por isso que toda crise econômica que ameaça a acumulação de lucro é acompanhada pelo impulso para cortar os serviços sociais.


Segundo Kelton, porém, esses ataques não estão enraizados em relações sociais e econômicas objetivas, mas surgem de formas de pensamento ultrapassadas, ou seja, que o governo deve equilibrar seu orçamento.

Como um pregador religioso, a MMT anuncia: “Eu sou a sabedoria e a luz. Abandonem seus velhos modos de pensar e a sociedade pode avançar se não para o céu, pelo menos para um lugar melhor”.

Kelton apresenta exemplos do que ela chama de “mito do déficit”, alguns deles decorrentes de sua participação na equipe econômica que assessorou o Senador Bernie Sanders em 2015.

Mas se, como afirma, a MMT é uma explicação de como o sistema monetário realmente funciona, então qual é a razão para a persistência da mitologia diante da perspectiva que a MMT oferece? Se um mito persiste, então ele deve ter raízes sociais objetivas. Ele deve servir a forças de classe definidas. Ele não pode ser atribuído à ignorância, assim como a persistência da religião não pode ser explicada.

Essa questão pode ser investigada e a razão dos ataques à saúde e outros serviços pode ser revelada considerando a situação que existiria se os formuladores de políticas fornecessem uma explicação objetiva para suas medidas.

O que aconteceria se eles dissessem ao Congresso que a razão pela qual os gastos com serviços sociais devem ser cortados e que não há “dinheiro” para financiá-los é que tais gastos são uma redução da mais-valia extraída da população trabalhadora necessária para manter e aumentar os lucros de Wall Street?


Se tal explicação científica, derivada do funcionamento real da economia capitalista, fosse apresentada em meio a crescentes tensões de classe, impulsionaria uma crise política que levaria ao crescimento do sentimento anticapitalista e socialista.

Não estamos de forma alguma sugerindo que os membros do Congresso estejam cientes do funcionamento real da economia capitalista, assim como Kelton não está. Mas o fato deles invocarem a necessidade do governo de cortar gastos a fim de equilibrar seu orçamento, como uma família, desempenha um papel político definido, que está enraizado na estrutura de classe do capitalismo. É a cobertura ideológica para os serviços que prestam a Wall Street.

A MMT desempenha seu papel encobrindo esse sistema ao desviar a atenção dos processos objetivos subjacentes no trabalho, e concentrando-se nas concepções dos políticos e dos formuladores de políticas.

Ela defende a perspectiva de que a ordem econômica e política capitalista, que permite o vasto acúmulo de riqueza nas mãos de uma oligarquia financeira à custa da sociedade, pode ser milagrosamente transformada para beneficiar o povo se apenas os formuladores de políticas puderem ver a luz que supostamente proporciona.

Na apresentação de Kelton, a MMT não só pode eliminar os conflitos de classe e as contradições dentro dos Estados Unidos, como é capaz de transformar o imperialismo americano de um poder predatório, voltando-se cada vez mais para o militarismo para manter seu domínio global e ameaçando desencadear outra guerra mundial, em um benfeitor para o povo do mundo.

É preciso reconhecer, escreve, “que o governo americano pode fornecer todos os dólares de que nosso setor privado doméstico precisa para atingir o pleno emprego, e pode fornecer todos os dólares que o resto do mundo precisa para construir suas reservas e proteger seus fluxos comerciais. Em vez de usar seu status hegemônico de moeda para mobilizar reservas de ouro atendendo a seus próprios limitados interesses, os EUA poderiam liderar o esforço para mobilizar recursos para um Green New Deal global, mantendo as taxas de juros baixas e estáveis para promover a tranquilidade econômica global”. [p. 151]


É dito que não há realmente nada de novo sob o sol, e a MMT, como defendida por Kelton, é muito vinho velho em garrafas novas. É a versão moderna das teorias que foram apresentadas em períodos anteriores de crise capitalista para desviar os trabalhadores das tarefas reais em jogo. Não surpreende que tenha sido aproveitada por setores da pseudoesquerda, como a deputada dos Socialistas Democráticos dos EUA (DSA) Alexandra Ocasio-Cortez, que afirma que a MMT deve “fazer parte de nossos debates”.

O caminho a seguir não é a falsa perspectiva de alguma reforma do sistema capitalista através de “truques de circulação”, mas sua derrubada pela classe trabalhadora para estabelecer um governo operário a fim de abrir caminho para o estabelecimento de uma economia socialista democraticamente controlada e organizada na qual as vastas forças produtivas são utilizadas para atender às necessidades humanas.

Teoria Monetária Moderna e a crise do capitalismo: Primeira Parte

 

Modern Monetary Theory and the crisis of capitalism: Part one   

The Deficit Myth by Stephanie Kelton - por Nick Beams


Esta é a primeira parte de um artigo de duas partes.

Ao longo da história do capitalismo e de suas recorrentes crises, várias teorias foram apresentadas por teóricos de “esquerda” que sustentam que essas crises e os males sociais que geram podem ser amenizados, se não totalmente eliminados, mudando o sistema monetário sem tocar nos fundamentos da própria produção capitalista.

Embora se apresentem como de “esquerda” e “progressistas”, defendendo a reforma do sistema capitalista, a história mostra que em períodos de grande crise procuram desviar a classe trabalhadora do programa da revolução socialista, ao mesmo tempo em que fornecem os fundamentos ideológicos para forças políticas que defendem uma solução contrarrevolucionária para a crise.

A Teoria Monetária Moderna (MMT, na sigla em inglês), cujos princípios fundamentais são apresentados no livro The Deficit Myth: Modern Monetary Theory and the Birth of the People’s Economy (O Mito do Déficit: Teoria Monetária Moderna e o Nascimento da Economia do Povo) por uma de suas principais defensoras, é a mais recente expressão deste fenômeno.

A luta contra tais tendências remonta às próprias origens da economia política marxista.


No inverno de 1857-58, em meio a uma crise econômica global, Marx escreveu o rascunho inicial da obra que viria a se tornar O Capital, publicado em 1867. Esse rascunho chegou até nós na forma dos Grundrisse, publicado pela primeira vez em inglês em 1973, que tem uma relevância particular para a compreensão da MMT.

O ponto de partida de Marx foi uma análise do dinheiro e a refutação das teorias do anarquista francês Proudhon, na época considerado um importante teórico socialista. Os Grundrisse começam com uma citação de um dos seguidores de Proudhon, Alfred Darimon:

A raiz do mal é a predominância que a opinião atribui obstinadamente ao papel dos metais preciosos em circulação e troca.

Pierre-Joseph Proudhon

Segundo os proudhonistas, os males sociais do capitalismo poderiam ser superados se apenas o ouro e outros metais preciosos fossem retirados de seu status privilegiado como dinheiro e reduzidos ao status de mercadoria comum. Se isso fosse feito, a desigualdade do intercâmbio entre capital e trabalho poderia ser eliminada e a igualdade natural de todas as formas de trabalho poderia ser restaurada.

A essência da refutação de Marx consistia em mostrar que o dinheiro não era algum dispositivo inventado com o objetivo de facilitar as trocas, mas surgiu do próprio sistema de produção de mercadorias, no qual o trabalho dos particulares envolvidos na produção para o mercado, ou seja, a produção social, tem que encontrar alguma medida independente. O dinheiro, insistiu Marx, não surge de uma convenção mais do que o Estado, mas se desenvolve a partir de uma sociedade baseada na troca de mercadorias.

O ponto essencial que Marx estabeleceu, através de uma análise detalhada das concepções proudhonistas, foi que o dinheiro não criou os conflitos e contradições da sociedade capitalista, que assumiu formas cada vez mais violentas quando a força de trabalho se tornou uma mercadoria na forma de trabalho assalariado, mas sim “o desenvolvimento dessas contradições é que cria o poder aparentemente transcendental do dinheiro”. [Grundrisse, Penguin Books, 1991, p. 146]

O objetivo dos proudhonistas era acabar com os males sociais do capitalismo, que estavam se tornando cada vez mais claros devido a suas crises recorrentes, alterando as relações de distribuição e circulação, facilitadas pelo dinheiro, sem tocar nas relações sociais subjacentes da produção, baseadas na produção de mercadorias.

Aqui Marx levantou o que ele chamou de questão fundamental: “Podem as relações existentes de produção e as relações de distribuição correspondentes sofrer uma revolução por uma mudança no instrumento de circulação, na organização da circulação?” E, ainda, “pode tal transformação da circulação ser empreendida sem tocar nas relações de produção existentes e nas relações sociais que nelas repousam?” [Grundrisse, p. 122]

O esquema proudhonista, que se baseava na continuação da produção de mercadorias, a base da economia capitalista, era uma utopia. Era, como Marx o caracterizava, o mesmo que abolir o Papa sem acabar com a Igreja Católica.

As teorias proudhonistas da década de 1850, que buscavam resolver as crises do capitalismo através do que Marx chamou de “truques de circulação”, foram repetidas de várias maneiras desde então.

Em meio ao sofrimento social que afligia os trabalhadores e pequenos agricultores nos EUA durante a década de 1890, resultado de uma severa crise econômica que viu o desemprego aumentar para cerca de 25% em 1893, William Jennings Bryan tornou-se o candidato presidencial do Partido Democrata em 1896 prometendo remover a “cruz de ouro” da humanidade.

Acreditava-se que o padrão-ouro tinha sido a causa da deflação, e o sistema monetário deveria ser alterado de maneira que passasse a ser lastreado também em prata, o que promoveria um retorno à prosperidade econômica.

O aprofundamento da crise econômica do capitalismo global após a Primeira Guerra Mundial levou ao desenvolvimento de uma série de teorias que afirmavam que a crise poderia ser aliviada através de mudanças nas formas de distribuição econômica e no sistema monetário.

Nos anos 1920, C. H. Douglas apresentou a teoria do crédito social. Contrastando a diferença entre o valor da produção da fábrica e os pagamentos feitos sob a forma de ordenados, salários e dividendos, ele propôs o pagamento de um dividendo nacional para compensar esse déficit. A teoria do crédito social de Douglas e sua noção de demanda insuficiente encontraram expressão na visão de Keynes, que sustentou que os problemas da economia capitalista resultavam de uma demanda efetiva insuficiente, uma lacuna que deveria ser preenchida pelos gastos governamentais.

Durante a década de 1920, as principais moedas ainda estavam lastreadas em ouro – uma situação que passou a ser vista por alguns críticos como responsável pela continuação de condições econômicas de crise.


Em 1924, o economista alemão Georg Friedrich Knapp elaborou uma nova teoria do dinheiro. Ele sustentou que o dinheiro não surgiu da produção de mercadorias e não tinha nenhum valor intrínseco. Era um símbolo (“token”) criado pelos governos como meio de pagamento das obrigações fiscais que impunham. Essa teoria, conhecida como cartalismo (derivada da palavra latina charta, que significa símbolo), é a base da MMT.

Todas essas teorias, desde a de Proudhon, passando pela de Keynes até a MMT, têm uma perspectiva política muito definida. Tendo surgidas em períodos de crise econômica e social, elas se baseiam na posição de que estas crises não surgem das contradições inerentes ao capitalismo, enraizadas na produção de mercadorias e na transformação da força de trabalho em uma mercadoria e sua exploração, mas podem ser superadas através de uma mudança nas políticas governamentais e do desenvolvimento de um novo sistema monetário e de crédito.

O objetivo delas é desviar a classe trabalhadora da tarefa que lhe é imposta por essas crises – a de derrubar o modo capitalista de produção e empreender a reconstrução da economia em bases socialistas. Ao contrário, segundo esses teóricos, a tarefa do dia é convencer os poderes que devem abandonar suas teorias incorretas e adotar as soluções que propõem, que fornecerão uma base para a expansão capitalista e evitarão a necessidade de uma revolução social. Esse é o tema essencial do livro de Kelton e da MMT.

Desde o início, Kelton escreve com lirismo sobre o poder da MMT, afirmando que desafia o status quo com uma economia sólida e “nos dá o poder de imaginar uma nova política e uma nova economia”, nos permitindo ver que “outro tipo de mundo é possível, um mundo em que podemos investir em cuidados de saúde, educação e infraestrutura duradoura”. [The Deficit Myth, pp. 12-13]

Não há dúvida de que tais coisas são materialmente possíveis, devido ao vasto desenvolvimento das forças produtivas, criadas pelo trabalho de milhões de trabalhadores, que seriam utilizadas para satisfazer as necessidades humanas numa economia socialista planejada. Mas são impossíveis de alcançar sob o capitalismo devido às relações sociais em que se baseia – relações que a MMT ignora completamente, tratando a economia capitalista não como um sistema social, com divisões de classe irreconciliáveis, mas como uma espécie de máquina.

De acordo com Kelton, os males sociais criados pelo capitalismo são o resultado não de suas contradições objetivas, mas de um pensamento incorreto. Ela sustenta que políticas econômicas que priorizam a necessidade humana e o interesse público são possíveis dentro do capitalismo apenas se “nossas restrições autoimpostas” forem abandonadas.

Essas restrições, sustenta, surgem da forma como os gastos do governo são vistos e comparados com os gastos domésticos. Uma família tem que adquirir dinheiro para financiar suas despesas e deve equilibrar seu orçamento. Ou seja, é usuária de dinheiro. O governo, por outro lado, é emissor de dinheiro e não está sujeito a tais restrições, argumenta.

Uma família não pode criar dólares para financiar suas despesas, mas o governo pode. Isso significa que os limites de gastos que se aplicam a uma família não se aplicam a um governo soberano que emite sua própria moeda. Ele pode sempre financiar seus gastos simplesmente imprimindo mais dinheiro, ou apenas criando dinheiro apertando um botão de computador no Federal Reserve que transfere dinheiro do banco central para outra conta bancária.


A distinção entre os usuários de moeda e o emissor de moeda está no coração da MMT” [p. 18], escreve.

A MMT não sustenta, entretanto, que não há limites para tais gastos, mas que eles não são determinados por restrições financeiras. Eles surgem somente quando todos os recursos disponíveis da economia real são plenamente utilizados e outras demandas sobre eles, resultantes dos gastos do governo, vão além da capacidade da economia, levando assim à inflação. Mas até esse momento, há muitos problemas sociais, econômicos e até ecológicos, como a mudança climática, que podem ser resolvidos.

O primeiro ponto a ser observado é que esta não é apenas uma agenda “EUA em primeiro lugar”, mas uma agenda “Somente os EUA”.

O Tesouro americano tem uma capacidade aparentemente ilimitada de criar mais dólares devido ao papel do dólar como moeda global.

Entretanto, Kelton afirma que outros países, como emissores de sua própria moeda, incluindo países como o Reino Unido, Austrália e Canadá, podem fazer a mesma coisa, e a MMT “oferece perspectivas” para países com pouca ou nenhuma soberania monetária, como Panamá, Tunísia, Grécia, Venezuela e muitos outros. 


Mesmo um exame preliminar demonstra a falsidade dessa concepção. As moedas de outros países não gozam da mesma posição que o dólar americano. Se, por exemplo, o Reino Unido ou a Austrália, para não falar de países como a Argentina ou a Venezuela, simplesmente criassem reservas ilimitadas de dinheiro e as utilizassem para atender às necessidades sociais, rapidamente descobririam que o valor de sua moeda entrou em colapso nos mercados mundiais, dando origem à inflação e minando sua capacidade de pagar dívidas contraídas em dólares americanos.

Mas não obstante o papel privilegiado do dólar americano, existem também limites inerentes à criação de dólares pelo Fed dos EUA, que derivam da própria natureza do dinheiro.

A produção de mercadorias, a base da economia capitalista, é realizada por entidades privadas, empresas e indivíduos. Mas, ao mesmo tempo, é uma produção social. Toda sociedade tem que resolver a questão de como o trabalho social disponível é alocado, como os recursos de mão de obra disponíveis são distribuídos, a fim de continuar a funcionar.

Em uma sociedade socialista, essa tarefa será realizada através de um plano consciente e de uma organização democrática. Na sociedade capitalista, ela é realizada através do mercado. Isso significa equiparar os diferentes tipos de mão de obra necessários para o funcionamento da sociedade. Em uma sociedade produtora de mercadorias, onde o trabalho é ao mesmo tempo social, mas realizado de forma privada, essa alocação é realizada através do sistema de valor.


O valor de cada mercadoria é determinado pela quantidade de mão de obra socialmente necessária para produzi-la. Mas esse valor deve adquirir uma forma material independente, e essa forma é o dinheiro. Como disse Marx: “O dinheiro é tempo de trabalho na forma de um objeto geral, ou a objetivação do tempo de trabalho geral, tempo de trabalho como uma mercadoria geral”. [Grundrisse, p. 168]

É através do dinheiro que se expressa o vínculo social objetivo que realmente existe entre os produtores privados individuais. Os economistas, escreveu Marx, dizem que as pessoas depositam confiança em uma coisa, o dinheiro, porque não depositam fé umas nas outras. “Mas por que eles têm fé na coisa? Obviamente porque essa coisa é uma relação objetivada entre pessoas; porque é uma relação objetivada de valor de troca e o valor de troca nada mais é do que a relação entre as atividades produtivas das pessoas”. [Grundrisse, p. 160]

   Continua AQUI a segunda parte


quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

UE: «soberania» imperialista

Artigo tirado do sitio web portugués Confederación Intersindical Galega (CIG) 

 Os «valores europeus», tão invocados para impor mecanismos de ingerência política e ideológica «dentro de portas», ficam na gaveta quanto à Turquia, à Ucrânia e à abstenção na ONU de resoluções que condenam o nazi-fascismo ou reconhecem os Montes Golã como território Sírio, ou ainda quando a UE alinha com os EUA na agenda desestabilizadora na Venezuela

 As conclusões do Conselho Europeu nos dias 10 e 11 de Dezembro – e o conjunto de decisões que o antecederam e o vão suceder – confirmam uma estratégia de tirar partido da actual situação para tentar dirimir contradições e levar a cabo novos saltos de aprofundamento da União Europeia. A agenda não é nova.

 No seu discurso de Setembro no Parlamento Europeu, no chamado «Estado da União», a presidente da Comissão Europeia já tinha sido muito clara nas orientações que coincidem, não surpreendentemente, com a estratégia e as manipulações ideológicas emanadas dos sinistros corredores do Fórum de Davos em torno da ideia do «renascimento» ou «recomeço» do capitalismo, agora apresentado como «digital», «verde», «social», «para todos».

Terri Robl rejeita a resolução da ONU porque inclui linguagem que difama termos como “nazista ou“ fascista ”.

As prioridades do trio de presidências (onde se inclui a portuguesa) e as conclusões do Conselho Europeu apontam todas no mesmo sentido. Debaixo de uma capa «social», de que o pilar europeu dos direitos sociais é «marca», tentar o desenvolvimento de renovadas fileiras de acumulação e centralização de capital – as chamadas «agendas verde e digital» –, nomeadamente com a centralização da decisão sobre investimentos de acordo com os projectos e interesses dos grandes monopólios e das principais potências; alargar e aprofundar o mercado único em variadas áreas (com as consequentes ondas privatizadoras), como é exemplo o projecto da «União da Saúde», entre vários outros; institucionalizar mecanismos adicionais de dependência, imposição e ingerência, como é o caso dos novos condicionalismos agora associados ao Orçamento da UE e ao Fundo de Recuperação, com a lenga-lenga das «reformas estruturais» e a institucionalização da ingerência política e ideológica; transferir ainda mais parcelas da soberania nacional para o plano supranacional, como é o caso dos «recursos próprios» do Orçamento da União Europeia; aprofundar a deriva securitária, invocando o terrorismo, a «segurança digital», a «defesa dos valores», ou instrumentalizando hipocritamente a questão das migrações; e, finalmente, lubrificar e acentuar a natureza imperialista e intervencionista da União Europeia.

Sobre este último aspecto, a União Europeia invoca sempre dois argumentos de fundo para defender a sua dita «política externa e de segurança»: a UE «é um espaço que privilegia a paz, o diálogo, e a diplomacia» e tem de ter «a sua própria identidade». Ora, o Conselho acaba de adoptar duas decisões que mais uma vez comprovam a total falsidade de tais pressupostos. Aprovou um sistema de sanções que manda às malvas vários aspectos do Direito Internacional e do tal diálogo. Já a sua identidade própria é esmagada pela nova profissão de fé de lealdade aos EUA, e de submissão a quase todas as agendas da Administração entrante, incluindo o reforço do militarismo e da NATO.

Pelo meio, os «valores europeus», tão invocados para impor mecanismos de ingerência política e ideológica «dentro de portas», ficam na gaveta quanto à Turquia, à Ucrânia e à abstenção na ONU de resoluções que condenam o nazi-fascismo ou reconhecem os Montes Golã como território Sírio, ou ainda quando a UE alinha com os EUA na agenda desestabilizadora na Venezuela, nas renovadas pressões e provocações contra o Irão ou quando se submete à agenda norte-americana em variados domínios, escancarando as portas à tão almejada «frente unida» contra a China. É caso para dizer que a tal «soberania europeia» de que falava Macron, é, como sempre foi, a «soberania imperialista».



Colômbia: Anay soma-se a mais de 300 lideres de movimentos sociais assassinados em 2020


Otro líder social es asesinado en el suroeste de Colombia
A Rede de Direitos Humanos do Pacífico Nariñense (REDHPANA) e o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento e a Paz (Indepaz) alertaram na semana passada que Luis Alberto Anay, líder social e líder comunitário, foi assassinado no departamento de Nariño, no sudoeste da Colômbia.

De acordo com a Indepaz, o número de líderes comunitários assassinados ao longo de 2020 aumentou para 308. Anay, que também era professor, teria sido assassinado na comunidade de El Chontal, no município de Tumaco.

A vítima teria ido pescar no dia 22 de dezembro, data em que foi vista pela última vez. Seu corpo foi encontrado dias depois com claros sinais de violência. As entidades exigiram em nota a abertura de uma investigação oficial. “Até agora, não há informações oficiais sobre o ocorrido, por isso é necessária uma investigação rápida sobre este novo assassinato contra um líder social do Pacífico Nariño, que se soma a dezenas de eventos semelhantes ocorridos na região desde a assinatura do Acordo Final pela Paz, apesar de ser um território fortemente militarizado ”, diz o documento.

A Indepaz também denunciou que nos últimos sete dias três lideranças sociais foram assassinadas em Tumaco. No total, ocorreram 90 massacres e 65 ex-combatentes das FARC mortos em todo o país em 2020.




terça-feira, 29 de dezembro de 2020

New York Times abandona o Projeto 1619 que instituiria o inicio da escravidão como "fundação" dos Estados Unidos

World Socialist Website Responds to Announcement of Nikole Hannah-Jones’s Pulitzer por Tom Mackaman e David North


O New York Times abandonou sem anúncio ou explicação a reivindicação central do Projeto 1619: de que a "verdadeira fundação" dos Estados Unidos aconteceu em 1619 - o ano em que os primeiros escravos foram trazidos para a Colônia da Virgínia - e não 1776.

A introdução ao projeto, quando ele foi lançado em agosto de 2019, declarava que

O Projeto 1619 é uma iniciativa importante do New York Times que comemora o 400º aniversário do início da escravidão estadunidense. Ele tem como objetivo reformular a história do país, entendendo 1619 como a nossa verdadeira fundação e colocando as conseqüências da escravidão e as contribuições dos negros estadunidenses no centro da história que contamos a nós mesmos sobre quem somos.

O texto revisado diz agora que:

O Projeto 1619 é uma iniciativa atual da The New York Times Magazine, que começou em agosto de 2019, o 400º aniversário do início da escravidão estadunidense. Ele tem como objetivo reestruturar a história do país, colocando as conseqüências da escravidão e as contribuições dos negros estadunidenses no centro da nossa narrativa nacional.

Uma mudança semelhante foi feita na versão impressa do Projeto 1619, que foi enviada a milhões de crianças em idade escolar em todos os estados. A versão original dizia:

Em agosto de 1619, um navio apareceu no horizonte, perto de Point Comfort, um porto costeiro na colônia britânica da Virgínia. Ele transportava mais de 20 africanos escravizados, que foram vendidos aos colonos. Os Estados Unidos ainda não eram os Estados Unidos, mas este foi o momento do seu início. Nenhum aspecto do país que seria formado nesse momento deixou de ser afetado nos 250 anos de escravidão que se seguiram.

Na versão do site, essa reivindicação decisiva foi removida. Agora, ela diz:

Em agosto de 1619, um navio apareceu no horizonte, perto de Point Comfort, um porto costeiro na colônia britânica da Virgínia. Ele transportava mais de 20 africanos escravizados, que foram vendidos aos colonos. Nenhum aspecto do país que seria formado nesse momento deixou de ser afetado pelos anos de escravidão que se seguiram.

Não está claro quando o Times removeu a sua afirmação de "verdadeira fundação", mas um exame das versões antigas do texto do Projeto 1619 armazenadas indica que isso ocorreu provavelmente em 18 de dezembro de 2019.


Essas exclusões não são apenas mudanças de redação. A reivindicação da "verdadeira fundação" é o elemento central da afirmação do Projeto 1619, de que toda a história dos EUA possui origem e é definida pelo ódio racial branco pelos negros. De acordo com essa narrativa, defendida pela criadora do projeto, Nikole Hannah-Jones, a Revolução Americana foi uma contrarrevolução racial preventiva conduzida pelos brancos na América do Norte para defender a escravidão contra os planos britânicos para aboli-la. O fato de não existirem evidências históricas para apoiar essa afirmação não impediu que o Times e Hannah-Jones declarassem como mitos a identificação histórica de 1776 com a criação de uma nova nação, assim como a afirmação de que a Guerra Civil era uma luta progressista com o objetivo de destruir a escravidão. De acordo com o New York Times e Hannah-Jones, a luta contra a escravidão e todas as formas de opressão foram lutas que os negros estadunidenses sempre travaram sozinhos.

O "desaparecimento" realizado pelo Times do seu argumento central, sem qualquer explicação ou anúncio, é um ato impressionante de desonestidade intelectual e fraude. Quando lançou o Projeto 1619 em agosto de 2019, o Times proclamou que o seu objetivo era mudar radicalmente o que e como os estudantes eram ensinados sobre a história dos EUA. Com o objetivo de criar um novo currículo baseado no Projeto 1619, centenas de milhares de cópias da versão original da narrativa, conforme publicada na New York Times Magazine, foram impressas e distribuídas para escolas, museus e bibliotecas em todo os Estados Unidos. Um grande número de escolas declarou que alinhariam os seus currículos de acordo com a narrativa fornecida pelo Times.

A remoção da afirmação de que 1619 foi a "verdadeira fundação" se mostrou nesta última sexta-feira, 18 de setembro. Hannah-Jones foi entrevistada no canal de televisão, CNN, e pediram que ela desse uma resposta à denúncia fascista de Donald Trump do Projeto 1619. Hannah-Jones declarou que a afirmação de "verdadeira fundação", "é claro", não era verdadeira. Além disso, ela fez a afirmação espantosa, e comprovadamente falsa, de que o Times nunca havia apresentado tal argumento.


A conversação se deu da seguinte forma:

CNN: A ordem executiva de Trump fala sobre uma concepção equivocada que eu sei que você tentou abordar sobre o que é o Projeto 1619, que não é um esforço para reescrever a história de quando esta nação foi fundada.

Hannah-Jones: É claro, sabemos que 1776 foi a fundação deste país. O projeto não argumenta que 1776 não foi a fundação do país.

Isso é uma mentira. Hannah-Jones tem feito repetidamente a afirmação de "verdadeira fundação" em inúmeros tuites, entrevistas e palestras, que estão em artigos de notícias e videoclipes prontamente disponíveis na internet. A própria conta no Twitter de Hannah-Jones incluía uma imagem sua com 1619 no fundo e com o ano de 1776 riscado ao lado.

Hannah-Jones, presa em uma mentira, responde com mentiras novas e ainda maiores. A jornalista célebre do Times não apenas nega o argumento central do seu projeto. De forma contraditória, ela também diz que a afirmação da "verdadeira fundação" foi apenas um acessório retórico. Ela disse à CNN que o Projeto 1619 era apenas um esforço para colocar o estudo da escravidão na vanguarda da história dos EUA.

Se tudo o que o Times buscava era chamar mais a atenção para a história da escravidão nos anos em que ela existiu na América do Norte britânica (1619-1776) e nos Estados Unidos (1776-1865), como Hannah-Jones afirma agora, então nunca teria havido uma controvérsia. O WSWS e os estudiosos entrevistados pelo site — James McPhersonGordon WoodVictoria BynumJames OakesClayborne CarsonRichard CarwardineDolores Janiewski, e Adolph Reed, Jr. — jamais questionaram a importância da escravidão no desenvolvimento histórico dos Estados Unidos. Dezenas de milhares de livros e artigos acadêmicos têm sido dedicados ao estudo da escravidão e do seu impacto sobre o desenvolvimento histórico dos Estados Unidos.


Em sua resposta inicial ao Projeto 1619, publicado no início de setembro de 2019, o WSWS explicou:

A escravidão estadunidense é um assunto colossal, com ampla e duradoura importância histórica e política. Os eventos de 1619 fazem parte dessa história. Porém, o que ocorreu em Point Comfort é um episódio na história da escravidão mundial, que remonta ao mundo antigo, e das origens e desenvolvimento do sistema capitalista mundial.

refutação do Times apresentada pelo WSWS forneceu um relato sobre o surgimento da escravidão no Ocidente, o seu papel central na formação do capitalismo, e a sua destruição revolucionária na Guerra Civil. Hannah-Jones respondeu à intervenção do WSWS denunciando os seus escritores como "racistas anti-negros" no Twitter.

Quando Wood, McPherson, Bynum e Oakes, acompanhados por Sean Wilentz de Princeton, escreveram uma carta aberta ao Times em dezembro solicitando correções específicas para esclarecer erros factuais, eles enfatizaram que a sua objeção não era por conta da importância da escravidão. Os cinco historiadores expressaram a sua consternação "com alguns dos erros factuais no projeto e no processo fechado por trás dele".

Jake Silverstein e Nikole Hannah-Jones

O editor da New York Times Magazine, Jake Silverstein, publicou uma resposta arrogantee desdenhosa, na qual ele rejeitou categoricamente as críticas dos historiadores:

Embora respeitemos o trabalho dos signatários, compreendamos que eles são motivados pela preocupação acadêmica e aplaudamos os esforços que fizeram em suas próprias escritas para esclarecer o passado da nação, discordamos da sua afirmação de que o nosso projeto contém erros factuais significativos e seja conduzido mais pela ideologia do que pela compreensão histórica. Apesar de acolhermos críticas, não acreditamos que o pedido de correções do Projeto 1619 seja justificado.

carta vergonhosa de Silverstein surgiu em 20 de dezembro. Naquele momento, ele sabia que o Projeto 1619 do Times possuía falhas críticas, e sabia que o jornal havia feito secretamente uma alteração fundamental no texto online do artigo que havia sido questionado pelos importantes historiadores. O comportamento de Silverstein demonstrou uma completa falta de ética profissional e de integridade intelectual.

Times deve agora emitir uma declaração pública reconhecendo a sua distorção da história e a tentativa desonesta de encobrir o seu erro. O jornal deve emitir um pedido de desculpas público aos professores Gordon Wood, James McPherson, Sean Wilentz, Victoria Bynum, James Oakes e todos os outros estudiosos que procurou desacreditar por terem criticado o Projeto 1619. Para ser completamente franco, Silverstein e os seus co-conspiradores no conselho editorial do Times deveriam ser demitidos de seus cargos.

Além disso, o Prêmio Pulitzer de Melhor Comentário entregue a Hannah-Jones neste ano por seu artigo principal, no qual as falsas alegações sobre a "verdadeira fundação" e a Revolução Americana foram feitas, deveria ser anulado.

O Projeto 1619 nunca foi sobre esclarecimento histórico. Conforme o WSWS advertiu em setembro de 2019, o "Projeto 1619 é um componente do esforço deliberado para injetar a política racial no centro das eleições de 2020 e fomentar divisões dentro da classe trabalhadora". Como revelado em um vazamento sobre uma reunião com a equipe do Times, o editor executivo, Dean Baquet, acreditava que mudar o foco após a fracassada campanha contra a Rússia auxiliaria o Partido Democrata. Baquet disse:

A raça e o entendimento de raça deveriam fazer parte de como cobrimos a história dos EUA ... uma razão pela qual todos nós assinamos o Projeto 1619 e o tornamos tão ambicioso e amplo foi para ensinar os nossos leitores a pensar um pouco mais assim. A raça no próximo ano - e eu acho que isto é, para ser franco, o que eu espero que vocês tirem desta discussão - será uma grande parte da história dos EUA.


A fraude perpetrada pelo Times já teve sérias conseqüências políticas. Conforme o WSWS advertiu, o Projeto 1619 foi um enorme presente para Donald Trump. Em 17 de setembro, Dia da Constituição, Trump deu um discurso no Museu do Arquivo Nacional no qual ele se posicionou obscenamente como defensor da Declaração da Independência e da Constituição contra a "esquerda radical", fazendo referência especificamente ao Projeto 1619. Em sua forma tipicamente ameaçadora, Trump advertiu que ele "restauraria a educação patriótica" e que "nossa juventude será ensinada a amar os EUA".

A entrevista de Hannah-Jones na CNN foi feita em resposta aos ataques de Trump. Ela observou que Trump está tentando "trazer o Projeto 1619 para as guerras culturais". Ela acrescentou: "Ele está claramente disputando em uma campanha nacionalista que está tentando incitar divisões raciais, e ele vê isso como uma ferramenta nesse arsenal".

Isso é verdade. Porém, Hannah-Jones é uma das principais "incitadoras" das divisões raciais; e foi o New York Times que trouxe "o Projeto 1619 para as guerras culturais", atacando ferozmente todos os críticos de uma narrativa histórica que faz do ódio racial a força motriz da história dos Estados Unidos.

A falsificação da história sempre serve aos interesses das forças políticas reacionárias. Ao repudiar e denegrir a Revolução Americana e a Guerra Civil, o New York Times proporcionou uma oportunidade para Trump se posicionar fraudulentamente como um defensor do grande legado democrático das revoluções americanas no interesse da sua política neofascista.



Vale a pena aproveitar esse Super Batepapo

SBP em pauta

DESTAQUE

COMO A MÍDIA MUNDIAL ESTÁ DIVULGANDO HISTÓRIAS FALSAS SOBRE A PALESTINA

PROPAGANDA BLITZ: HOW MAINSTREAM MEDIA IS PUSHING FAKE PALESTINE STORIES Depois que o Hamas lançou um ataque surpresa contra Israel, as forç...

Super Bate Papo ao Vivo

Streams Anteriores

SEMPRE NA RODA DO SBP

Arquivo do blog