quinta-feira, 22 de fevereiro de 2024

TIC-TAC: Netanyahu esperando para ver o quão alta a queda pode ser

As provocações de Benjamin Netanyahu suscitaram reações que o massacre de 29. 000 civis gazenses não provocaram. Todos os protagonistas do Médio-Oriente Alargado e do Ocidente, que constantemente se confrontam, uniram-se de súbito contra ele.
Se cada um encara o futuro de Gaza de forma diferente, todos estão de acordo para dizer que Israel não pode continuar com supremacistas judaicos no seu governo. Caminha-se para um deslocamento provisório dos Gazenses sob proteção egícia, seguido de uma purga em Israel.

reacção de Washington, seguida pelos seus principais aliados, à « Conferência para Vitória de Israel » e à ovação dada ao Rabino Uzi Sharbaf em presença de 12 ministros em exercício alterou profundamente os dados no Médio-Oriente.

Lembremos que este rabino fora condenado à prisão perpétua em Israel pelos seus assassinatos de árabes. Ele assume-se como uma continuação do «Gangue Stern» que assassinou, em 1944, o Ministro britânico das Colónias e, em 1948, o enviado especial das Nações Unidas, o Conde Folke Bernadotte.

O seu grupo sobreviveu durante toda a Guerra Fria, cometendo massacres e atrocidades em África e na América Latina, sob a cobertura da luta contra o comunismo. À época, os Anglo-Saxões achavam estes criminosos úteis para os seus planos [1]. Já não é o caso hoje em dia e nem Londres, nem Washington, que sabem do que eles são capazes, podem deixá-los voltar-se contra si.

Esta « Conferência para a Vitória de Israel » foi uma ameaça directa aos Anglo-Saxões que tentam levar Benjamin Netanyahu à razão [2] . Nas horas que se seguiram, Washington tomou medidas extraordinárias contra os supremacistas judeus com os quais tinha até então contemporizado, nomeadamente uma proibição de colecta e de transferência de fundos através dos bancos ocidentais. Ela foi seguida sucessivamente por Londres, Berlim, Paris e, finalmente, pelos outros principais aliados.

O Presidente norte-americano, Joe Biden, tentou uma última vez convencer o Primeiro-Ministro israelita (israelense-br), Benjamin Netanyahu, a aceitar um cessar-fogo de seis semanas. Este não modificou a sua posição de forma alguma, confirmando a intenção de prosseguir a guerra e atacar Rafah. Quando muito, aceitou enviar uma delegação para retomar no Cairo as negociações que haviam sido interrompidas em Paris. Por fim, Joe Biden, estupefacto por o ouvir anunciar um novo massacre de civis, exclamou perante inúmeras testemunhas que Netanyahu não passava de um «idiota de merda» (sic).

Entretanto, Israel prosseguia a sua campanha contra a Agência das Nações Unidas de Assistência e Obras para os Refugiados da Palestina no Próximo Oriente (UNRWA). Depois de ter exigido a dissolução da Agência porque 12 dos seus funcionários (quer dizer, 0,09% dos seus funcionários em Gaza) teriam participado na Operação «Torrente de Al-Aqsa», as FDI alegavam que o Hamas tinha instalado o seu Quartel-General num túnel por baixo da sede da UNRWA. em Gaza. E quando o Director da Agência, Philippe Lazarini, exclamava que ignorava todas estas acusações, o embaixador israelita nas Nações Unidas, Gilad Erdan, tuitava : « Não é que não soubesse, você não queria era saber. Nós mostrámos os túneis dos terroristas sob as escolas da UNRWA e fornecemos provas que o Hamas utiliza a UNRWA. Nós imploramos-lhe que procedesse a uma busca global em todas as instalações da UNRWA em Gaza. Mas você não apenas se recusou, como escolheu enfiar a cabeça na areia. Assuma as suas responsabilidades e demita-se já. Todos os dias encontramos mais provas que em Gaza, o Hamas=a ONU e vice-versa. Não se pode ter confiança naquilo que diz a ONU ou naquilo que se diz a partir de Gaza ».

Privada de financiamento, a Agência aprestava-se a fechar as suas portas. Ela informou os governos libanês e jordano que já não seria capaz de ir em socorro não só dos habitantes Gazenses e Cisjordanos, mas também das centenas de milhar de refugiados que eles acolhem.

De repente, a mudança de opinião dos Anglo-Saxões transformou o ambiente. Alguns Estados restabeleceram o financiamento da UNRWA, enquanto o Irão apelava à calma. Os ataques contra as bases militares dos EUA tornaram-se mais raros. Os Anglo-Saxões e o Eixo da Resistência, inimigos irreconciliáveis no mês passado, voltavam a falar entre si através de intermediários e talvez até directamente. Por todo o lado, as negociações interrompidas foram retomadas.

Esta acalmia será provavelmente de curta duração, mas, de momento, os Ocidentais tem os mesmos interesses que todos os povos do Médio-Oriente : interromper a loucura assassina dos sionistas revisionistas. Washington já não encara uma derrota de Israel como a sua própria derrota. Já não se sente mais obrigada a colaborar, contra sua vontade, no massacre dos Gazenses. Pelo contrário, uma vitória de Israel seria uma derrota dos Estados Unidos, incapazes de manter a paz e cúmplices de um massacre.

Esta reviravolta muda tudo.

No seio do gabinete de guerra, em Telavive, a certeza de gozar de uma impunidade em todas as circunstâncias esfuma-se: sem o apoio de Washington, o Hezbollah faria de Israel pouco menos que picado.

Precisamente no Líbano, isso já não parece ser extremista quando ele exige a aplicação total da Resolução 1701. Assim, ele retirará as suas forças do Sul do Líbano, se Israel retirar igualmente as suas da fronteira, e não da linha de demarcação, mas sim da fronteira.

Nem os Estados Unidos, nem a França se referem mais às suas propostas para a paz israelo-libanesa. Para Washington, tudo por uma paz separada e uma divisão do Eixo da Resistência. Para Paris, a mesma coisa, mas com uma roupagem jurídica mais complexa, fazendo referência ao acordo de Naqura (1996) e à Resolução 1701 (2006). Pelo contrário, eles esperam que o Hezbolla mantenha a sua pressão sobre as FDI na fronteira Norte para as impedir de atacar Rafah na Faixa de Gaza.

Os pesos pesados do Médio Oriente, que são o Egipto, a Arábia Saudita, a Turquia e o Irã, fazem passar as suas dissensões para segundo plano, reaproximam-se a fim de fazer face ao inimigo comum: os sionistas revisionistas. A Arábia Saudita e o Irão renovaram os seus laços, há um ano, graças aos bons ofícios da China Popular [3].

O Presidente turco, Recep Tayyip Erdoğan, dirigiu-se ao Egito para se encontrar com o seu homólogo, Abdel Fattah al-Sissi, com o qual até aqui recusava falar. Com efeito, em 2013, o General al-Sissi derrubara o Presidente Mohamed Morsi (apoiado por Erdogan-ndT), dando-se o caso que este último tinha falsificado a sua eleição [4] e que, primeiro, 40 milhões de Egípcios se haviam manifestado contra ele, e depois 33 milhões haviam festejado a sua queda [5].

O Egipto está a organizar, a toda a pressa, um vasto acampamento capaz de receber 1 milhão de Gazenses no Sinai. O grupo al-Arjani deve terminar as obras de terraplanagem e arranjos finais em 23 de Fevereiro [6]. Os Palestinianos poderiam ser autorizados a escapar das bombas israelitas e a refugiar-se lá. A Turquia e a Arábia Saudita viriam então em sua assitência.
Evidentemente, ninguém pretende caucionar a expulsão dos Palestinianos das suas terras. Além disso, todos se concertam para o se segue : como derrubar Benjamin Netanyahu e os sionistas revisionistas que o rodeiam?

Devemos, pois, contar nas próximas semanas com um cataclismo político em Israel. Entretanto, se Benjamin Netanyahu desaparecer da cena política, o Ucraniano Volodymyr Zelensky também se achará na berlinda.

A questão é saber se, neste caos, cada protagonista manterá os seus compromissos e prosseguirá o plano comum até ao seu final, ou se alguns atores se aproveitarão da confusão para impor as suas soluções.


Thierry Meyssan Intelectual francês, presidente-fundador da Rede Voltaire e da conferência Axis for Peace. As suas análises sobre política externa publicam-se na imprensa árabe, latino-americana e russa. Última obra em francês: Sous nos yeux. Du 11-Septembre à Donald Trump. Outra obras : L’Effroyable imposture: Tome 2, Manipulations et désinformations (ed. JP Bertrand, 2007). Última obra publicada em Castelhano (espanhol): La gran impostura II.

Notas:

[1] “Rompe-se o véu : as verdades escondidas de Jabotinsky e Netanyahu”, Thierry Meyssan, Tradução Alva, Rede Voltaire, 25 de Janeiro de 2024.

[2] “Em Jerusalém, a « Conferência para a Vitória de Israel » ameaça Londres e Washington”, Thierry Meyssan, Tradução Alva, Rede Voltaire, 13 de Fevereiro de 2024.

[3] “A China negoceia a paz entre Arábia Saudita e o Irão”, Tradução Alva, Rede Voltaire, 23 de Março de 2023.

[4] “A Comissão Eleitoral das presidenciais Egípcias cede à chantagem da Irmandade Muçulmana”, Tradução Alva, Rede Voltaire, 26 de Abril de 2016.

[5] “A sorte de Morsi prefigurará ados Irmãos muçulmanos?”, Thierry Meyssan, Tradução Alva, Rede Voltaire, 8 de Julho de 2013.

* | Voltairenet.org | Tradução Alva

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