a) e deus disse: faça-se a luz,
Prenderam os golpistas.
Primeira vez na história,
A história, refez o seu curso,
O Rio deixou de correr para a nascente.
O Delta, do povo com o futuro.
Só se tem a dimensão da lucidez,
Que nunca foi lúcido,
O suficiente, num mundo.
O mundo donde o Rio corre.
O correr do Rio,
Rio da lucidez, onde.
Os seguidores do Deus único,
Deus da paz, celebra,
A morte é a exclusão.
Só a lucidez, do lúcido poeta,
Imagina, a paz, sem fome.
Então, é louco o poeta,
Que loucamente sabe.
Não há lucidez ao defender a exclusão,
Muito menos em nome do Deus.
Santo Semfé
A importância da memória histórica diante das sombras da ditadura
A história do Brasil é marcada por episódios que, muitas vezes, parecem correr como um rio em direção ao seu delta: inevitáveis, mas cheios de desvios e turbulências. Recordo aqui um momento emblemático — o período em que o Serviço Nacional de Informações (SNI) ocupava papel central na engrenagem da ditadura militar. O chefe do órgão, detentor de segredos de Estado, acabou por se evadir, deixando atrás de si rastros de cumplicidade e silêncio. Entre seus auxiliares, destacava-se o ajudante de ordens, figura que mais tarde se tornaria protagonista em outros capítulos da política nacional.
Era o Dia das Crianças, numa época em que a data não carregava o glamour midiático de hoje. Nesse contexto, o então chefe do SNI tentou articular um “golpe dentro do golpe”. A ditadura, já corroída por dentro, havia criado sua própria rede de sustentação: a chamada RAFE-LAFE (Rede de Apoio à Fuga e Extração), mecanismo que garantia proteção e fuga para corruptos, assassinos e torturadores. A chamada “distensão política” — ou abertura lenta e gradual — nada mais era do que um processo cuidadosamente desenhado para assegurar impunidade aos responsáveis pelos crimes do regime.
Foi contra esse cenário que o general Sílvio Frota se insurgiu. Seu objetivo era impedir que a ditadura, já marcada pelo sangue derramado nos porões da repressão, avançasse ainda mais em sua lógica de violência. Frota, ao lado de seus ajudantes de ordens, esteve diretamente envolvido na repressão à reconstrução da União Nacional dos Estudantes (UNE), símbolo da resistência estudantil. Entre os nomes que emergem desse período está o do general da reserva Augusto Heleno, hoje lembrado não apenas por sua trajetória militar, mas também por sua ligação com os mecanismos de repressão.
Esses episódios revelam como ditadores e torturadores foram homenageados com nomes em ruas, praças, rodovias e até escolas, perpetuando uma memória distorcida. A ditadura não apenas matou e torturou, mas também construiu um legado simbólico que ainda resiste no espaço público.
É verdade que os passos dados contra novas tentativas golpistas parecem pequenos diante da magnitude dos crimes do passado. Ainda faltam responsabilizações mais amplas: os financiadores, os articuladores e, sobretudo, os líderes religiosos que transformaram seus templos em centros de propagação da escuridão. Foram eles que embalaram — e ainda embalam — teses que negam o pensamento crítico, sustentando a ideia de que questionar seria contrariar a vontade divina.
A memória histórica é, portanto, essencial. Sem ela, corremos o risco de permitir que as sombras da ditadura continuem a se projetar sobre o presente, obscurecendo o futuro democrático que o Brasil tanto necessita.

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