Por: Douglas N. Puodzius
Certa vez, participei de uma aula
sobre meio ambiente onde se discutia como salvar o mundo de um cataclisma. A
discussão transcorria na perspectiva dos resultados futuros provocados por uma
economia baseada no consumo cada vez mais desenfreado de recursos não renováveis.
Nesse contexto, concluía-se pela impotência de reparação do planeta antes de se
tornar inabitável pelo ser humano. Como enfrentar a questão?
As intervenções não deixavam
dúvida... Uma visão holística do problema determinava como grande saída: a bendita
consciência do consumidor. A economia verde era a solução mágica. A velha lei
da oferta e da procura resolveria a parada. Tanto mais evoluísse a tecnologia verde,
mais barato seria produzir com responsabilidade ambiental, despoluindo o planeta
e garantindo produtos para que todas as classes pudessem consumir –
responsavelmente – tudo o que desejassem, para todo o sempre.
Na contramão dos modernos ambientalistas,
eu previ que a economia verde seria praticada em nichos ricos, ambientalmente
bem cuidados, enquanto a economia tradicional seria a característica do consumo
nos guetos poluídos das classes baixas. Inclusive, apontei como vantagens dessa
estrutura social, além de reduzir, e muito, os anos a vida dos pobres, também
enfraquecer sobremaneira as possibilidades desse grupo se organizar coletivamente
com o sentido de enfrentar a situação.
Não! Nada de consciência de
classe, formando um exército para fazer enfim a revolução socialista tão almejada.
Nada disso: antevi que diante das depreciadas condições de vida, o povão buscaria
soluções pautadas pelo: cada um por si e Deus por todos. Aliás, enfatizei a
ideia do “Deus por todos” como mote de uma posição existencial, que seria muito
reforçado entre os miseráveis para que morressem rezando, em silencio, sem dar
trabalho.
Os ambientalistas não aceitavam
minhas observações, recusando-se a aceitar que, mesmo a elite, não seria tão
funesta ao ponto de expor milhões de seres humanos ao sofrimento e a morte. Lembraram
que; senão por amor, por necessidade de mão de obra, precisariam tratar os
pobres com certa decência.
Eu apenas apontei que uma das
premissas da discussão, era o avanço tecnológico da indústria verde que, por
óbvio, evoluiria reduzindo a dependência de mão de obra humana nos processos,
como atualmente opera o pop-agronegócio.
Ainda assim, já não querendo mais
ouvir argumentos, alguns insistiram que os homens civilizados de bom coração
não permitiriam acontecer esta anátema, em pleno século XXI. Eu apenas recomendei
que consultassem o histórico da linha da miséria e explicassem por que, na história
do capitalismo, a linha da extrema pobreza teria se movido, em sentido positivo, somente
depois dos avanços comunistas, a partir dos anos 1900. Não por coicidencia, exato período quando,
paulatinamente, concentrou-se bem mais da metade da população mundial vivendo sob
regimes econômicos distantes do capitalismo clássico. Recomendei observarem que, durante o predomínio do capitalismo clássico, 94% das pessoas viviam na linha
abaixo da miséria e, pedi assim que ninguém mais duvidasse; o quanto de nada representa
a vida do pobre para a elite.
Dito isto, peço agora:
A esquerda deve parar de repetir como
papagaio, o jargão tão bonito de falar entre os capitalistas: É a economia,
meu caro!
Não é a economia, porra
nenhuma! É a luta de classes, camarada! Botem isso na cabeça, de vez...
Uma das características da
atualidade é fugir do maniqueísmo, tão comum em tempos antigos, que era
compreender o mundo através de uma visão limitada pela dualidade religiosa de bem
e mal.
De fato, procurar os tais tons de
cinza, evitando o preto e branco de outrora, enriquece as compreensões e nos
torna bem mais tolerantes ante a diversidade do mundo. Contudo, se antes havia
certa radicalidade, quase paranoica, exigindo que se identificasse os dois lados da moeda e
obrigatoriamente os qualificasse na ordem de lados opostos, negativo e positivo, coisa boa ou ruim para a carne e para o espirito, na modernidade; é o inverso que garante o bom selo
de pensamento esclarecido e libertário. Assim
é dever da intelectualidade dos tempos modernos, olhar tudo na vida como se
fosse uma esfera, sem lados definidos, coisa disforme, lisa, sem espinhos, que deve ser sempre observada de todos os ângulos
possíveis, para ser de fato compreendida integralmente, determinando suas diversas facetas boas e ruins ou neutras, a depender da posição do observador.
Ocorre que, por incrível que pareça, a ideia de declarar que nem tudo é ruim em essência e nem tudo é bom por natureza, procurando sempre igualar os dois lados, colocando-se em posição distante, querendo garantir uma análise imparcial, ou como se diz, comumentemente; não ideológica, pode ser sim uma pessima providencia, na medida em que se trata do mundo humano, onde ninguém pensante é o cara "de fora", o tal fulano distante.
Entre a intelectualidade, esse é o modelo consensual para proceder uma
compreensão bem apurada da realidade cada vez mais complexa das relações no
mundo atual. Entretanto, é nesse olhar santo que, não pré-julga as coisas, que
se choca o ovo da serpente. Trata-se de um erro até ingênuo diante dos
fenômenos responsáveis pela própria existência humana. Não se lega direitos iguais
para os dois lados e nem se observa a distância quando se está entre a sanidade
e o câncer – Se para o primeiro, tudo, para o último, nada – pura dualidade, sem
discussão.
Na maioria das vezes, essa necessidade de dar complexidade aos fatores e a suas conexões é apenas uma maneira de fugir da
realidade. Esse tipo de análise leva a conclusões medíocres, distante dos atritos ideologicos, produzindo propostas sem reais soluções para o problema, medidas que apenas desejam eliminar os
extremos sem realmente atacar as causas e fazer mudanças..., é a tal da terceira via.
A verdade, é que a ideia de navegar
no meio do rio pode ser como o desejo pelos bons produtos de propagandas enganosas.
Aquelas maravilhas, bem baratinhas, que a gente só conhece quando abre a embalagem
e confere o péssimo negócio. Assim o é porque, no caudaloso rio da realidade, a
vida nos cobra militar numa das margens, sempre... E mais... A vida implacável nos
pune por tentar nadar entre as piranhas, no centro do leito perigoso desse Riachão,
tão manso, com suas águas traiçoeiras.
Longe das complexidades, é fácil entender
por que isso acontece: É inescapável considerar que estamos todos submetidos a
uma vida ordenada pela dualidade da luta de classes.
Não existe possibilidade de compreendermos
tudo em nossa vida, querendo esconder de nós mesmos que, até as ocorrências mais
banais de nossos cotidianos, não são explicadas pela luta de classes: - Como
dormi ontem? Onde dormi? Há que horas fui para a cama? Que horas acordei? Escovei
os dentes? Tomei um banho? Tomei café da manhã? Comi o quê? Absolutamente tudo
é realmente e por completo compreendido, apenas se submetido à dualidade das classes
que disputam a sociedade.
Não! Você não se levantou esta manhã, na suíte de sua mansão, depois desceu a escadaria bem trajado com o seu hobby chinês e encontrou a mesa já
posta, tudo ricamente disposto para o seu deleite, com: pães de diversos tipos,
mel e açúcar mascavo, frutas frescas, queijos e embutidos da melhor qualidade. Não
foi assim... O mordomo não esperou por você para puxar sua cadeira e acomodá-lo
confortavelmente, enquanto desejava um bom dia, com um largo sorriso nos lábios.
Nós sabemos que não foi assim e sabemos por que não foi assim...
Agora, o mais importante de todo
esse saber; é ter a consciência de que; não só não foi assim, como não é para
ser assim e é mais ainda necessário que não seja assim... Esse lado mais importante
do saber é escamoteado pelo olhar por outro ângulo, aquele que nos retira a
responsabilidade de lutar, de buscar a mudança. É quando se aceita que fulano
pode se servir do sangue de outro, como fosse natural vampirizar a humanidade
porque assim o é desde sempre ou porque existem cem mil outras explicações devidamente
eleitas para provar que não existe luta de classes.
É extremamente necessário que a
esquerda sempre inicie suas analises a partir da luta de classes. Só assim, a compreensão
não será manipulada pelo jogo dos espelhos, que refletem só o que se deseja ver
como senso comum, turvando o olhar ao tomar como causas e consequências tudo o
que em verdade, vem depois... acontece apenas como evento resultado desse atrito social, que se
nega existir.
Não! Não existe meritocracia!
Não! Não existe sorte! Não! Não existe: meus ancestrais trabalharam para
caralho! Não! Não existe: Deus ajudou! Não! Não existe: É culpa do governo! Não!
Não é natural a sociedade classes! Não! Não existe: Não é bem assim, a gente
tem que ver de diversos ângulos! Só existe uma explicação: É a luta de
classes, camarada!
A primeira estorquia, a segunda reprimia, a TERCEIRA VIA assistia e, nunca, nada fazia. Contornar a realidade em nome da paz romana (traduzida por muitos como governabilidade) está esgotando o planeta. Chegamos, ou ultrapassarmos, o ponto de não retorno. Neste caos anunciado alguém, certamente, será mais prejudicado nesta FARSA de mundo DESCLASSIFICADO.
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