De um dito popular, sempre atual: "quem tem boca, fala o que quer, quem tem ouvidos, ouve o que não quer".
A sociedade brasileira vem sendo bombardeada por propaganda golpista — mesmo durante as convivências “excludentes” dos próprios golpes. Esses bombardeios não partem apenas dos golpistas, “daqueles que lucram com o golpe da ocasião”, mas também dos desprovidos de senso crítico que, pela ausência de um mínimo de leitura, agradecem a um hipotético deus o privilégio de viver, mesmo que sob o ardor da chibata.
Juntando esses dois absurdos, o Brasil, que ao mesmo tempo precisa — em nome de uma dignidade mínima — condenar à prisão os navegantes da última nau golpista, “lembremos: só é possível punir a tentativa”, já que, uma vez consumada, a ordem reinante será a do golpe.
Então?
Nós, defensores de um “ESTADO DE DIREITO”, ainda que burguês e pregador de uma igualdade de oportunidades inexistente — poderíamos até argumentar os privilégios herdados como terras, riquezas e saberes elitistas — poderíamos ir, ainda ou precisamente, ao nada irrelevante fato de as religiões estarem sempre ao lado dessas mesmas elites.
Chegamos, por um passe de mágica, ao Brasil do pós-08/01/23. Ou seria o Brasil pós-prisão de Lula, em 2018, para que ele não concorresse às eleições? Ou, ainda, o Brasil do golpe “batizado de impeachment” de 2016? Ou mesmo o Brasil que jamais puniu os golpistas de 1964? Percebam: precisamos entender qual é, afinal, a pacificação que está sendo proposta.
Poderíamos, por obrigação de saber histórico, lembrar que os golpistas não punidos sempre articularam e efetivaram novos golpes. É preciso, então, chamar a atenção daqueles sensibilizados por narrativas que apresentam vítimas — com aparência de bezerros desmamados — que vêm a público como perseguidos por um suposto sistema judicial injusto.
É exatamente aqui que entra a “historinha nada fictícia” de uma mãe — radical de direita, basicamente por formação religiosa, “daquela Igreja Católica das caminhadas com Deus pela liberdade, em 1964”. Essa mãe, lembro bem, bastante real, sempre esbravejou contra os direitos humanos. Por infelicidade, perdeu um filho num assalto — fato que agravou seu ódio contra aqueles “criminosos” que defendem dar dignidade a quem comete crimes bárbaros como ceifar a vida de alguém.
Todavia, porém, contudo, esta mãe — bastante real — teve uma filha envolvida como cúmplice num quádruplo assassinato por motivo fútil. Essa mãe militou intensamente pelos direitos humanos básicos de sua filha — apenas de sua filha. Hoje, com a pena já cumprida, é bastante provável que, caso haja um novo 08/01, essa filha esteja entre os que depredam prédios públicos para, principalmente, pleitear um novo AI-5 que “torture, exile ou até execute” este cronista.
Escrevo hoje não por ódio a essa mãe nada imaginária; tampouco escrevo por medo de reviver os pavores dos porões da ditadura. Escrevo, basicamente, para que mais de quinhentas mil pessoas não venham a óbito — entre elas, muitos amigos e familiares de amigos dessa mesma mãe. Escrevo, ainda, para que trinta milhões de brasileiros não retornem à extrema pobreza — rescaldo tanto da ditadura militar quanto do ex-desgoverno ainda hoje apoiado por essa mãe que, ironicamente, nada imaginaria.
Sabendo que é impossível convencer essa mãe em particular — ou qualquer outro ser humano que ancora suas convicções políticas num Cristo tão irreal quanto absurdo, descrito na vertente pentecostal da Bíblia —, lembro que todos os excluídos que apoiam a volta dos regimes de exceção têm esse ponto em comum: o Cristo pentecostal. Nem todos, é claro. Mas?

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