sábado, 4 de novembro de 2023

Equilíbrio político de Lula está valendo a pena, mesmo frente a resistência do Bolsonarismo

Lula’s political balancing act is paying off
O presidente do Brasil estabilizou a economia, com habilidade de mestre controla o Congresso e é popular. Mas o bolsonarismo resiste.

Quando Jair Bolsonaro foi desqualificado para concorrer a cargos públicos por oito anos, no dia 30 de junho, as redes sociais estavam cheias de memes humilhantes.

A condenação do ex-presidente pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) parecia a consequência lógica do clima de restauração democrática que se seguiu aos ataques golpistas de 8 de Janeiro. Esse dia fatídico para a democracia brasileira apenas facilitou a contundência dos três poderes. Lula demitiu militares de alto escalão e oficiais de inteligência. Depois, em meados de setembro, o Supremo Tribunal Federal (STF) condenou o primeiro réu do dia 8 de janeiro a 17 anos de prisão, confirmando a linha dura do Judiciário contra atos golpistas. E o Congresso aprovou a persecução criminal de Bolsonaro, de apoiadores militares e de ex-ministros.

Acabou a impunidade de que gozava Bolsonaro enquanto governou o país. Além disso, a sua popularidade foi corroída por múltiplos casos de corrupção, especialmente o escândalo da apropriação de jóias da nação doadas por xeques sauditas.


A máquina judicial encurralou a sua família, incluindo a sua esposa evangélica Michelle. E pressionou Mauro Cid, tenente-coronel que estava a seu serviço, a assinar um acordo de colaboração com a Polícia Federal (PF) em troca de redução de pena. As declarações do coronel Cid implicam diretamente Bolsonaro na elaboração de um documento golpista, o que complica ainda mais criminalmente o futuro do ex-presidente.

Desvendando o Bolsonarismo?

Em fevereiro, a Folha de S. Paulo, um veículo de notícias neocapitalista, concluiu que o primeiro mês de governo Lula foi mais de esquerda do que seu primeiro mandato em 2003. Depois do que foi uma posse pouco ortodoxa, Lula começou a trabalhar atribuindo os cargos mais importantes em seu governo e empresas públicas a membros consagrados do Partido dos Trabalhadores (PT), e a apoiadores da esquerda.

A Operação Libertação para retirar os invasores e garimpeiros das reservas indígenas Yanomami elevou as expectativas da esquerda. Mas Lula, que tem muitas forças conservadoras no seu governo, optou por uma realpolitik sem grandes medidas progressistas para apaziguar os poderes constituídos e a oposição – algo que frustra a sua base eleitoral, mas necessário para se governar.

Ele está priorizando a restauração de programas sociais diminuídos ou completamente eliminados por Bolsonaro. Para citar alguns, o governo relançou o Minha Casa Minha Vida (um programa de construção de habitação social), o histórico Bolsa Família que tirou milhões de brasileiros da pobreza, o programa Mais Médicos (contratação de médicos em regiões remotas) e a Lei Paulo Gustavo ( apoio à cultura) vetado por Bolsonaro, entre outras coisas. Para desmantelar ainda mais o legado tirano de Bolsonaro, Lula assinou um decreto derrubando a flexibilização do uso de armas e adotou diversas medidas de apoio à conservação ambiental, ao ensino superior e à pesquisa científica.

Congresso Hostil

Mas em Junho o governo Lula sofreu um golpe de martelo. Uma medida provisória elaborada no Congresso despojou o Ministério do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas de seus poderes e retirou o poder de declarar terras indígenas do recém-criado Ministério dos Povos Indígenas. A medida continha uma verdadeira bomba-relógio, beirando a ilegalidade, para desmantelar o poder político do governo. Lula não teve escolha senão negociar sequestro legal com o arquiteto da mudança, o presidente da direita conservadora do Congresso, Sr. Arthur Lira.

A chantagem era explícita: Lira exigia como resgate mais orçamento público para os deputados (nos moldes do tão criticado “orçamento secreto” da era Bolsonaro) e mais cargos políticos para o centrão (bancada oportunista de deputados conservadores que se aliam com quem pagar mais).


Desde então, o presidente tem trabalhado para abrir espaço para forças da comitiva de Lira. Em janeiro, Lula já havia incorporado ao seu governo partidos centristas (como o Movimento Democrático Brasileiro (MDB) e o Partido Social Democrata (PSD) e até partidos de direita, como o União Brasil, partido do ex-juiz Sérgio Moro, que trabalharam para sua prisão. Nos últimos meses, Lula entregou ministérios aos Republicanos (ligados à igreja evangélica) e ao Partido Progressista (PP, força política de Arthur Lira), para conquistar seus votos.

O resultado das eleições de 2022 deixou as câmaras legislativas inclinadas para a direita. Os aliados de esquerda e centristas de Lula somavam 223 deputados em um Congresso de 513. A base de deputados alinhados ao bolsonarismo somava então 197. A formação de uma ampla frente democrática fez com que Lula pudesse voltar a contar com o Movimento Democrático Brasileiro de Simone Tebet (MDB) (42 deputados) e Partido Social Democrata (PSD, 42).

Mesmo assim, instrumentos jurídicos como as Propostas de Emenda à Constituição (PEC), que servem para modificar artigos da Constituição, exigem maioria de três quintos no Congresso (308 deputados). Por isso, Lula buscou uma aliança com forças conservadoras com peso explícito nas Câmaras.

O resultado é este: um ano após a derrota eleitoral de Bolsonaro, Lula controla o Congresso. Após meses de tensas negociações, o presidente conseguiu que os deputados de 24 dos 27 estados do Brasil apoiassem as medidas de seu governo. Mas ele pagou um preço.

O que teria acontecido se Lula tivesse decidido governar sem o apoio do partido centrista e implementado políticas públicas claramente esquerdistas?

Muito provavelmente, o governo Lula não teria obtido apoio suficiente para legislar e teria se deparado com um Congresso e um Senado aprovando constantemente medidas contrárias à agenda do governo. Ou mesmo encontrar o mesmo fim que a última presidente do PT, Dilma Roussef, encontrou.

Mas mesmo com estas alianças, o equilíbrio político do Brasil não está garantido. Tampouco basta a inédita cumplicidade do Supremo Tribunal Federal (STF) com as políticas públicas do governo.

A aprovação pelo Senado do Marco Temporário, que proíbe terras indígenas que não foram ocupadas antes da promulgação da Constituição de 1988, é o maior exemplo de uma revolta legislativa com desfecho imprevisível.

O Senado a aprovou apenas um dia depois de o STF declarar a lei inconstitucional, um tour de force. Posteriormente, o próprio Lula teve que vetar o texto, que está sendo reescrito no Congresso e já é uma grande dor de cabeça para o governo.

Aprovação e polarização de Lula

Em meio ao naufrágio da família Bolsonaro, a popularidade de Lula continua elevada. O controle da inflação (em torno de 5%) e da economia (o crescimento do PIB deverá ficar em torno de 3% até o final do ano) proporciona uma tábua de salvação inesperada para Lula. Cerca de 54% dos brasileiros aprovam o desempenho do presidente, em comparação com 42% que desaprovam, segundo a pesquisa "October Quaest".


A popularidade de Lula é visivelmente superior à de Bolsonaro um ano após as eleições, que era de cerca de 30%. Lula também conta com a aprovação de 25% dos eleitores que votaram em Bolsonaro no segundo turno em 2022.

Contudo, a sondagem Quaest também mostra alguns resultados menos favoráveis para o atual presidente. As viagens de Lula ao exterior, um dos carros-chefe de um governo que mostra ter retornado ao mundo, parecem ser sequestradas pela mídia de apoio a Bolsonaro fazendo com que este momento de glória saia pela culatra. Mais da metade – 55% – dos brasileiros acham que Lula viaja muito e 60% acham que as viagens não trazem bons resultados.

Além disso, a guerra em Gaza foi impulsionada pela família Bolsonaro. O fato de o Brasil não utilizar o termo terrorista para definir o Hamas, seguindo as orientações da ONU, tem servido de munição para o poderoso ecossistema de propagação de notícias falsas da extrema direita brasileira, que insiste em vincular Lula e a esquerda ao ataque do Hamas.


O primeiro tweet de Bolsonaro após os ataques em Israel afirmou que o “grupo terrorista” Hamas parabenizou Lula após sua vitória eleitoral. Algumas figuras proeminentes do bolsonarismo foram mais longe, enquadrando o Hamas, o Hezbollah e o governo Lula sob a égide do terrorismo.

Alguns dos tweets do ex-presidente, repletos de bandeiras israelitas, terminam com “Deus abençoe Israel, o Ocidente e o Brasil”, incutindo uma guerra cultural contra as supostas forças do mal que alegadamente ameaçam o Ocidente.

A polarização política continua muito viva no Brasil. A última pesquisa Datafolha revela que 29% dos entrevistados se declaram ‘petistas’ pró-Lula, enquanto 25% se identificam com a linha dura extremista do bolsonarismo.

Lula enfrenta agora o complexo desafio de implementar políticas socias e humanistas e, ao mesmo tempo, fechar acordos com as forças conservadoras das quais o seu governo depende. Neste momento, ele beneficia da trégua estratégica. Após o trauma catastrófico do governo Bolsonaro, as forças políticas e os movimentos sociais que apoiaram o retorno de Lula decidiram não criticar muito publicamente o governo.

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