Palace coup or class struggle: The political crisis in Washington and the strategy of the working class |
Enquanto os democratas estavam avançando acusações fraudulentas contra Trump, as políticas defendidas por várias organizações da pseudoesquerda de classe média que orbitam o Partido Democrata tinham como objetivo fundamental subordinar a luta contra Trump a uma fração da classe dominante americana.
O SEP e o WSWS foram os únicos que defenderam que a oposição da classe trabalhadora a Trump e a luta por sua remoção do poder deveriam se dar de maneira independente e com seu próprio programa.
Hoje, depois de manifestações em massa em julho terem sacudido o Brasil e o PT com os sindicatos e mesmo a pseudoesquerda estarem articulando uma aliança aberta com a extrema-direita contra o governo Jair Bolsonaro, esta declaração contém importantes lições que podem ser incorporadas à luta da juventude e da classe trabalhadora para levar adiante um programa independente contra o presidente fascistoide e a política de imunidade de rebanho da elite dominante brasileira.
1. Cinco meses após o início do governo de Donald Trump, a guerra política feroz em Washington chegou a um estágio crítico. O depoimento do ex-diretor do FBI James Comey perante a Comissão de Inteligência do Senado na semana passada está sendo usado pelos opositores de Trump na mídia e no establishment político para aumentar as acusações de que a Rússia interferiu nas eleições americanas e de conluio e encobrimento por parte de Trump e outras autoridades do governo.
2. As acusações contra Trump têm um caráter artificial e fraudulento, que é semelhante ao escândalo liderado pelos republicanos sobre os investimentos imobiliários no caso Whitewater do ex-presidente Bill Clinton e sua relação sexual com a estagiária da Casa Branca Monica Lewinsky; as investigações sobre o papel de Hillary Clinton no ataque de 2012 em Benghazi e as acusações relacionadas ao seu uso de um servidor de e-mail privado, e as alegações – promovidas por Trump – de que Barack Obama não era um cidadão americano. Em todos esses casos, as verdadeiras origens das divisões dentro da elite dominante foram deliberadamente obscurecidas com um amontoado suspeito de alegações.
3. A última manifestação da guerra política em Washington está enraizada em crises sociais, econômicas e geopolíticas incontroláveis que estão corroendo as bases do domínio global e da estabilidade nacional do capitalismo americano. Vinte e cinco anos após a dissolução da União Soviética, os esforços do imperialismo americano para sustentar seu domínio através da ação militar levaram a uma série de desastres. Quase uma década após o colapso econômico global de 2008, no qual a imprudência de Wall Street desempenhou o papel principal, o sistema financeiro americano permanece altamente instável, sustentado por uma expansão interminável da dívida. O caráter doentio do sistema econômico americano criou um sistema social oligárquico, cujas principais características são o parasitismo e um nível surpreendente de desigualdade social.
4. A eleição de Trump não foi um acidente. Trump é a personificação da oligarquia que governa os EUA. Seu governo, composto de bilionários e ex-generais, está intensificando fortemente um programa bipartidário de contrarrevolução social e militarismo selvagem internacionalmente. Mas dentro da classe dominante existem divisões acirradas sobre como o capitalismo americano deve responder aos seus problemas nacionais e internacionais. Essas divisões assumiram, sob Trump, uma intensidade extraordinária.
5. Trump e seu governo são inimigos ferozes da classe trabalhadora, se dedicando à destruição de seus direitos democráticos e a uma maior redução de seus padrões de vida. É um governo que está levando adiante uma agenda internacional baseada no chauvinismo dos “EUA em primeiro lugar”. A classe trabalhadora deve se opor a este governo e lutar por sua remoção. Mas esta tarefa não deve ser confiada aos opositores de Trump na classe dominante. A classe trabalhadora não pode permanecer como espectadora na luta entre Trump e os democratas. Ao contrário, ela deve desenvolver uma luta contra Trump sob sua própria bandeira e com seu próprio programa. Isso exige que ela tenha uma compreensão clara da dinâmica de classe da crise política que se desenrola.
6. Há três formas básicas de oposição ao governo Trump, representando os interesses de diferentes classes sociais.
A oposição da classe dominante a Trump
7. Em primeiro lugar, há a oposição de setores poderosos da classe capitalista. Os opositores de Trump dentro do establishment político, incluindo tanto democratas quanto republicanos, falam por uma fração da elite empresarial e financeira. Os métodos que eles estão usando em sua campanha contra Trump são fundamentalmente antidemocráticos, envolvendo tramas de bastidores com elementos dentro do establishment militar e de inteligência e da elite empresarial-financeira. Esses são os métodos de um golpe palaciano.
8. Suas diferenças com o governo Trump estão centradas principalmente em questões de política externa. Sua verdadeira preocupação não é com a suposta “subversão” da democracia americana pela Rússia, como se isso pudesse se comparar com a subversão da democracia americana pela própria classe dominante, mas com as ações da Rússia na Síria, que frustraram os esforços dos EUA para derrubar o governo de Bashar al-Assad. Eles estão determinados a evitar que Trump enfraqueça a política anti-Rússia desenvolvida sob Obama, à qual a campanha de Hillary Clinton se dedicou a expandir.
9. O foco maníaco na Rússia não é por acaso. As prioridades da política externa de Trump estão focadas, como é bem sabido, no confronto com a China. Sua suposta defesa de um “acordo” com a Rússia é incompatível com o plano estratégico apoiado pelas seções dominantes do establishment militar, de inteligência e de política externa. A destruição da capacidade da Rússia de frustrar as operações militares americanas é vista como central para o controle da massa terrestre eurasiática, sem a qual uma vitória americana no conflito de longo prazo com a China é considerada impossível.
10. Se Trump fosse afastado do cargo por seus opositores no “deep state” e no Partido Democrata, isso não representaria uma vitória da democracia, muito menos uma melhoria das condições da classe trabalhadora. Sob o governo Obama, a classe dominante supervisionou a maior transferência de riqueza de baixo para cima na história dos EUA, bem como uma expansão da guerra no exterior e um crescimento contínuo do poder do aparato de inteligência militar. Hillary Clinton, a favorita candidata de Wall Street, se comprometeu a aprofundar todas essas políticas, ao mesmo tempo em que prometia intensificar a guerra na Síria e o confronto com a Rússia. Os democratas não estão convocando audiências sobre o ataque ao sistema de saúde, o ataque aos trabalhadores imigrantes, a elevação de forças nacionalistas de extrema-direita dentro do governo ou os planos de guerra contra a Coréia do Norte, Irã e China.
11. Se os democratas alcançassem seus objetivos, com a remoção de Trump através de alguma forma de golpe político, isso colocaria o vice-presidente Mike Pence na Casa Branca, um homem mais polido do que Trump, mas não menos reacionário.
A oposição da classe média-alta
12. Outra força no campo anti-Trump é a de setores abastados de classe média, cuja oposição ao Partido Republicano está concentrada em efetuar uma distribuição mais favorável da riqueza dentro dos 10 % mais ricos da população. Essa camada é representada por várias tendências políticas que operam principalmente na órbita do Partido Democrata, incluindo uma série de organizações de pseudoesquerda (os Socialistas Democráticos da América [1], a Organização Socialista Internacional [2], a Alternativa Socialista [3], o Partido Verde) que priorizam as questões raciais, de gênero e de identidade sexual em relação às de classe.13. A característica da política de classe média é sua falta de independência em relação à classe dominante. Esse setor procura influenciar o Partido Democrata e ganhar seu apoio para reformas marginais do sistema capitalista. Enquanto os elementos mais da esquerda-liberal dentro deste meio político se referem a questões de desigualdade social, eles combinam, da maneira mais sem princípios, apelos semirreformistas com o apoio ao Partido Democrata e aos objetivos do imperialismo americano. Isso está ligado ao fato de que sua própria posição econômica privilegiada se baseia no aumento recorde dos lucros das empresas e dos preços das ações. Sua principal função política é manter a dominação da classe dominante sobre a classe trabalhadora. Durante as eleições de 2016, eles promoveram a campanha do senador Bernie Sanders, que canalizou a oposição social de massa por trás da campanha de Hillary Clinton, a candidata de Wall Street e das agências de inteligência. Sanders faz agora parte da liderança da bancada do Partido Democrata no Senado dos EUA.
A oposição da classe trabalhadora
14. Um terceiro e totalmente diferente conflito está se desenvolvendo – entre a classe dominante e a classe trabalhadora, a ampla massa da população, que sofre diversas formas de dificuldades sociais e está completamente excluída da vida política.
15. A realidade da crise social nos Estados Unidos é a base objetiva para inúmeras formas de resistência e oposição da classe trabalhadora. Apesar de o governo Obama ter deixado o cargo alegando que a vida nos Estados Unidos nunca havia sido melhor, o desemprego está em 8,6%, os salários estão estagnados e os trabalhadores enfrentam condições de trabalho brutais e a intensificação da exploração. Os lucros corporativos como parte da renda permanecem perto de recordes máximos, e a parte da renda que vai para o trabalho encontra-se perto de recordes mínimos.
16. A crise do sistema de saúde é grave e está piorando. O Obamacare intensificou o impulso das corporações para transferir o custo dos cuidados de saúde para seus funcionários. A deterioração do sistema de saúde nacional, combinada com uma epidemia de drogas cada vez maior, levou ao aumento das taxas de mortalidade e à diminuição da expectativa de vida. Os trabalhadores mais velhos estão trabalhando mais tempo porque não podem se aposentar, enquanto os trabalhadores jovens são sobrecarregados por níveis intoleráveis de dívida estudantil.
18. As famílias que fazem parte do 1% mais rico da população americana agora possuem aproximadamente a mesma quantidade de riqueza que os 90% na base da pirâmide social, enquanto 20 indivíduos têm tanta riqueza quanto os 50% mais pobres. 40% das famílias nos EUA possuem zero ou riqueza negativa, o que significa que suas dívidas superam seus bens. Os indivíduos que constituem o 0,1% e 0,01% mais ricos da população funcionam como seus próprios sistemas políticos, tendo à sua disposição vastas somas de dinheiro para comprar eleições, subornar políticos e, de outra forma, controlar o processo político. O governo Trump é, por si só, o reflexo político do caráter oligárquico da sociedade americana, o resultado de meio século de contrarrevolução social supervisionada tanto por democratas quanto por republicanos.
A estratégia política da classe trabalhadora
19. Há muitos sinais de uma raiva social cada vez maior entre amplos setores da classe trabalhadora, para os quais as condições de vida estão se tornando intoleráveis. As antigas frases usadas no passado para descrever a vida nos Estados Unidos – “a terra das oportunidades ilimitadas”, “o sonho americano”, etc. – tornaram-se sem sentido porque não têm nenhuma relação com a realidade. Está se tornando óbvio para a grande massa de trabalhadores que a sociedade existente serve exclusivamente aos interesses daqueles que já são muito ricos. O acesso às necessidades básicas da vida, tais como educação de qualidade, moradia digna e uma vizinhança segura, estabilidade no emprego, tempo de lazer adequado e cuidados médicos acessíveis, é determinado no nascimento – isto é, pela classe e pelo status econômico da família na qual um indivíduo nasce.
20. A implacável deterioração das condições de vida da classe trabalhadora nos Estados Unidos, e a violência despropositada das guerras sem fim travadas pela classe dominante em todo o mundo, refletem-se em uma profunda mudança na consciência social das massas de pessoas. Em um país onde os líderes políticos e a mídia cantam constantemente hinos à glória do capitalismo, pesquisas revelam um aumento do interesse e do apoio ao socialismo, especialmente entre os jovens.
21. A interação de condições objetivas de crise, tanto dentro dos Estados Unidos como internacionalmente, e a radicalização da consciência social de massa encontrarão expressão na erupção da luta de classes. A supressão da luta de classes durante décadas pela burocracia sindical, pelo Partido Democrata e pelos abastados patrocinadores das várias formas de política de identidade está chegando ao fim. A contrarrevolução social das elites dominantes está prestes a ser contraposta por um ressurgimento da luta da classe trabalhadora americana. As muitas formas diferentes de protesto social – em locais de trabalho, bairros e cidades inteiras – irão adquirir uma identidade de classe trabalhadora cada vez mais distinta, uma orientação anticapitalista e um caráter socialista. As lutas nos locais de trabalho individuais e nos bairros atrairão para a luta unificada setores mais amplos da classe trabalhadora.
23. Lutas em massa estão na agenda nos Estados Unidos. Comícios de protesto, manifestações e greves tenderão a adquirir um caráter geral de âmbito nacional. A conclusão política que resulta desta análise é que a luta da classe trabalhadora contra Trump e tudo o que ele representa levantará cada vez mais urgentemente a necessidade de um movimento político de massa, independente e em oposição tanto aos republicanos quanto aos democratas, contra o sistema capitalista e seu Estado. Essa tendência objetiva de desenvolvimento social deve ser desenvolvida como uma estratégia consciente de luta da classe trabalhadora. A tarefa de ligar as lutas contra todas as condições sociais deploráveis da vida sob o capitalismo com a luta política contra Trump e ambos os grandes partidos empresariais, com base em um programa socialista, deve ser levantada e tornar-se um tema de discussão dentro das fábricas, locais de trabalho, bairros da classe trabalhadora e escolas e faculdades em todo o país.
24. A preparação para as lutas de massa da classe trabalhadora requer o desenvolvimento de uma rede interligada de comitês populares nos locais de trabalho e nos bairros, independente e em oposição aos sindicatos pró-corporativos e anticlasse trabalhadora. A oposição em massa da classe trabalhadora ao governo Trump deve estar ligada a demandas claras anticapitalistas, anti-imperialistas e socialistas que atendam às necessidades da grande massa do povo.
25. O Partido Socialista pela Igualdade faz um chamado para que a estratégia de luta avançada nesta declaração seja amplamente discutida entre todos os setores de trabalhadores, jovens e estudantes, e todos aqueles que se opõem ao capitalismo e reconhecem a necessidade do socialismo. Distribua esta declaração entre os colegas de trabalho e amigos. Envie para o WSWS seus comentários e sugestões. Agradecemos todas as contribuições ponderadas com o objetivo de fazer avançar os interesses da classe trabalhadora.
26. Fazemos um chamado a todos aqueles que querem fazer parte desta luta para que se juntem ao Partido Socialista pela Igualdade (SEP). Pedimos aos jovens e estudantes que formem seções da Juventude e Estudantes Internacionais pela Igualdade Socialista (IYSSE). A tarefa do SEP e da IYSSE é tornar consciente o que é um movimento objetivo emergente, buscando transmitir um nível cada vez maior de compreensão à classe trabalhadora de seus objetivos e esclarecer a natureza do movimento que está se desenvolvendo. O SEP defenderá e ajudará na formação de comitês de fábrica e no desenvolvimento de organizações de oposição entre jovens e estudantes. Lutará para conectar o crescimento da luta da classe trabalhadora a um movimento político socialista, internacionalista e anti-imperialista para tomar o poder do Estado e reorganizar a vida econômica com base na necessidade social ao invés do lucro privado.
Notas do tradutor
[1] Os Socialistas Democráticos da América (DSA) são uma fração do Partido Democrata, que têm semeado ilusões, particularmente através de sua congressista mais destacada, Alexandria Ocasio-Cortez, que o partido da guerra imperialista e de Wall Street pode ser empurrado à esquerda. Eles são ligados à Revista Jacobin, que desde 2019 publica uma edição brasileira e tem se especializado em reunir representantes da pseudoesquerda nacional, incluindo stalinistas, em suas páginas. Leia mais em: Socialistas do Departamento de Estado: as sinistras operações da Jacobin e do DSA no Brasil[2] A Organização Socialista Internacional (ISO) colapsou em 2019, com a maioria de seus membros integrando-se aos DSA. No Brasil, a ISO estabeleceu uma proximidade política com o então MAIS, um racha do PSTU que agora, sob o nome de Resistência, é uma das tendências morenistas que atuam no PSOL. Leia mais em: ISO covers up Workers Party role in Bolsonaro’s victory in Brazil, Provocação entre frações, histeria de classe média e o colapso da Organização Socialista Internacional
[3] A Alternativa Socialista é a seção americana da Alternativa Socialista Internacional (ASI), cuja origem remonta ao Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores (CIT), criado em 1974 por, entre outras organizações, a tendência Militant liderada por Ted Grant e Peter Taaffe na Inglaterra. Em 1991, Grant e Allan Woods, que haviam sido expulsos da Militant por continuarem defendendo o entrismo no Partido Trabalhista, criaram a Tendência Marxista Internacional (TMI). Por sua vez, a ASI surgiu em 2019, quando o grupo de Taaffe resolveu abandonar o CIT. As seções brasileiras da ASI e da TMI são, respectivamente, as tendências do PSOL Liberdade, Socialismo e Revolução (LSR) e Esquerda Marxista. Leia mais em: Socialist Alternative’s Kshama Sawant joins the DSA: The Democratic Party politics of the pseudo-left
RECOMENDAÇÃO SBP
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