“Ouço, incrédulo e espantado, brasileiros que se dizem defensores dos direitos humanos comemorarem com empolgação a tomada de poder pelo Taleban no Afeganistão. Pessoas bem formadas, inteligentes e influentes e que, no entanto, não percebem (ou não querem perceber) as semelhanças entre as pautas do Taleban e as do bolsonarismo, que abominam e combatem.” Alex Solnik
Muita gente que se diz progressista
e até de esquerda anda chorando o destino das mulheres e meninas nas mãos do
maldito Taleban. Não se conformam quando presenciam alguém comemorando a
derrota do imperialismo norte americano em terras afegãs e logo acusam de estar
a se fazer festa pela vitória da barbárie. Aliás, Alex Solnik, do Jornalistas
pela Democracia e articulista do 247, é um exemplar clássico deste
tipo. Essa faceta ficou bem mais evidente durante o “Bom dia 247 de 16/08/2021”,
quando assistimos sua performance histérica frente ao posicionamento de Paulo
Moreira Leite contra a agressão colonialista sofrida pelo Afeganistão.
Não é o caso aqui de discutir a
ingenuidade de Solnik para além de seu texto: “Taleban é bolsonarismo ao cubo”,
mas seguramente um compendio de seus artigos permite posicioná-lo na condição
de modelo do progressismo Cristiano burguês. Um sujeito que tem como plano da natureza uma
espécie de capitalismo cristão, que é o ponto central de onde orienta o foco e a
perspectiva de suas análises.
Observando mais de perto o artigo
de Solnik, entende-se melhor o que é a retórica desse burgo progressismo. Por
exemplo; logo de saída ele ataca com a seguinte constatação: "Tal como
os bolsonaristas, o Taleban repudia a democracia e as eleições. Taleban é
bolsonarismo ao cubo". Como se vê, para o jornalista democrata,
existia no Afeganistão a preciosa democracia e as honestas eleições que, aliás,
são as mesmas que devemos nós brazucas empoderados pelo neoliberalismo democrata, também guardar com zelo contra as estocadas Bolsonaristas aqui no
Brasil.
Talvez, o próprio Solnik, en passant,
ateste que, lá como cá, nem a democracia e nem as eleições eram ou são perfeitas,
mas logo remediaria os pequenos desvios nesses planos com a advertência de que nada é perfeito, lembrando ser tal
deficiência fruto da natureza humana.
Assim sendo, podemos ter certo
que o ex-presidente Ashraf Ghani, líder máximo do Afeganistão por quase
vinte anos, democraticamente ungido e reungido em seguidas eleições, era um
legitimo representante do povo nas terras dos Mulahs. E amparados na mesma lógica liberal cristã, devemos considerar que o nosso palhaço Bozzo não é o resultado de um golpe
de estado e, por isso, caso apareça por aqui um grupo que, com a força de uma revolta
popular, deponha esse eleito presidente devemos; não comemorar, mas voltar nossos
olhos para o que acontecerá com as mulheres e com a meninas de nosso amado
Brasil.
Acontece que Solnik nunca dedicou
uma linha sequer para criticar o tempo de Ashraf no poder igual como tantas que dispensou
para: Noriega, ou para: Fidel, Chaves, Evo Morales e outros, cujas eleições foram
vencidas em processos coincidentemente não reconhecidos democráticos pelos Estados
Unidos. E do mesmo modo, ele não tem tanta preocupação com o presente das
mulheres e meninas da Arabia Saudita, Líbia ou Somália. Sua indignação é
pautada pelos editores americanos para quem não interessa discutir tais condições
nos países alinhados.
Era nessa perspectiva limitada que
Solnik esbravejava em defesa das mulheres que seriam proibidas de trabalhar e
estudar sob jugo do governo Taleban. Quem o acompanhava tinha a certeza que
todas elas trabalhavam e estudavam na suntuosa “democracia” de Ashraf. Entretanto,
uma rápida triscada dos dois neurônios traz à mente a destruição que se promove
nas leis que regem a relação capital/trabalho no Brasil democrático, para ter a
dimensão do que era o tão lamentado “trabalhar” no Afeganistão. Estudar então é um faz-me rir sem comentários.
A verdade é que se Ashraf Ghani,
munido de três trilhões de dólares, tivesse construído escolas e desenvolvido
condições de trabalho e distribuído o bem estar por todo país, ele teria sim sido eleito e
reeleito diversas vezes e o Taleban seria apenas outra seita em busca de
adeptos, talvez nem tanto radical como a atual. Também é verdade que se Ghani
tivesse feito tudo isso, Solnik estaria bradando contra o ditador afegão,
conforme seria classificado pelos juízes americanos, o líder desse governo
eleito em processo não democrático.
Contudo, não foi o que aconteceu.
Ghani foi um Bolsonaro ao cubo para o Afeganistão. Ele, que sempre bateu
continência para a bandeira americana, manteve-se no poder pela força das armas
e oprimiu o povo até o limite de sua paciência. Não foi por nada menos disso
que bastaram dois dias sem canhões da democracia que o elegeu para ver-se obrigado a fugir do país.
Brasileiros que se dizem defensores
dos direitos humanos devem comemorar com empolgação que o Afeganistão reconquistou
sua soberania. Porque afinal, se a força faz os primeiros escravos e a covardia
os perpetua, como disse Rousseau, brinda-se a autonomia Afegã, bebendo na
mesma fonte, pois, renunciar à liberdade é renunciar à qualidade de homem, aos
direitos da humanidade, e até aos próprios deveres. Não há
recompensa possível para quem a tudo renúncia.
Por fim, seria interessante saber
se Solnik comemorou ainda no século passado a vitória dos Guerreiros da
Liberdade sobre o poder impostos por uma governança pró soviética. Naquela época, eles
igualmente hoje traziam no alforje essa mesma cultura milenar tão endemoniada pelo
articulista democrata.
Acredite, os Talibãs governaram o
Afeganistão orientados por suas escrituras, que seguem sem alterar uma virgula,
sem diferença alguma daquelas que adotam atualmente, e sem que os Solniks de plantão os
denunciassem em praça pública.
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