Nesse 25 de Abril, enquanto os franceses comemoram a reeleição de Macron na França, os Portugueses celebram a vitória na Revolução dos Cravos.
Por: Douglas N. Puodzius
Tanto num caso como em outro existe e existiu a certeza de que os respectivos eventos marcaram uma derrota estratégica do fascismo. E, por conseguinte, nas leituras desses processos, em geral as perspectivas dos desdobramentos da vitória apontam com esperança para avanços na sociedade. Embora assim seja, é necessário destacar a enorme diferença do que significa ir em frente para cada um desses movimentos, visto que, em Abril de 1974, uma parcela considerável dos combatentes vitoriosos sonhou com a possibilidade de implantar o socialismo em Portugal, enquanto, na França de 2022, o máximo que se deseja é aliviar o inevitável massacre capitalista contra os trabalhadores que Macron já promove desde sua chegada ao poder. Por certo, a análise mais profunda destes contextos traz boas reflexões para a questão levantada por Rosa Luxemburgo sobre reforma e revolução.
Entretanto, apesar desse abismo que se verifica entre os sonhos portugueses e os desejos franceses, bem mais interessa o que se revela naquilo que se quer entendido como um encontro deles, quando se considera ambos em linha no combate ao fascismo e o que dessa compreensão se extrai para a luta que se trava no Brasil atualmente.
Ainda que nossa história abrigue Plínios Salgados aos montes e esbanje Médicis e Ustras como chuchus que cobrem as cercas e fazem boa referência de abundância no dito popular, a percepção brasileira é de que, como nunca, encaramos hoje a face mais grotesca do fascismo. Então, aqui também se faz a leitura de que à moda Portuguesa – com liberais e socialistas unidos – ou ao estilo francês dos eleitores de Jean-Luc Mélenchon, que votaram em Macron na segunda ronda, a união de Lulas e Alckimins será a via mais apropriada para impor uma derrota estratégica ao Fascismo.
Ora, e seria isso mesmo! Afirmo eu aqui sem hesitar. Mas, ressalvo que só o seria de fato – derrota estratégica do fascismo - se por acaso houvesse uma estratégia. Não há como se consumar uma derrota estratégica a ninguém se a estratégia inexiste e pior, não se pode falar em derrota de um contendor se a luta que se trava não é contra ele, mas é contraposição a um alvo que nenhum dano causa ao que se denomina oponente.
A verdade é que nem Salazar e nem Médici aos seus tempos e nem a senhora Le Pen ou Bolsonaro atualmente, representam o fascismo. Todos são apenas marionetes do real fascismo que é parte do instrumental capitalista para acumulação de riqueza.
Quando analisamos os resultados da derrocada do estado novo em Portugal ou o que se passou no Brasil pós ditadura militar, é inegável que as condicionantes capitalistas se mantiveram contra a classe trabalhadora e até foram agudizadas ao longo do tempo. E muito embora as geringonças - portuguesa e brasileira - tenham promovido reformas socialmente importantes, nada impediu que os capitalistas, no Brasil, sacassem de seu arsenal – sem nenhum arranhão - o velho estratagema de exploração decorado com amalgama fascista e estrategicamente, em Portugal, assim como na França, o expusessem em condições excepcionais, pronto para uso. Demonstrando que, para os capitalistas, no final, em todos os casos, a tal derrota do fascismo, significou manter tudo como dantes no bom castelo de Abrantes.
Então, a melhor lição que a esquerda pode tomar com base nesses enredos é não perder de vista a sua razão de ser, que é o que sempre foi o motivo de mobilizar esse campo da sociedade em permanente luta de classes: A derrota do capitalismo para implantação do socialismo no mundo. Coisa que com a assunção da tal retórica que prega pela derrota do fascismo, tem sido senão esquecida, muito escanteada, nesses tempos em que se comemora a vitória de Macron, como se o fascismo tivesse de fato sido derrotado.
Derrotar Bolsonaro só é estratégico se existir estratégia que culmine na derrubada do capitalismo e adoção do socialismo, senão é conquista vazia de propósito. Durante 14 anos a esquerda brasileira viveu de reformas que per si tensionaram a luta de classes. E sem noção estratégica para o que representava esse tensionamento, passou o tempo todo apenas cobrando por mais reformas. Foi por isso que o golpe aconteceu sem qualquer resistência.
Nenhum movimento de esquerda se levantou empunhando a bandeira da revolução. Afinal, se as condições objetivas e subjetivas estavam colocadas para o golpe, também estariam bem-postas para a revolução, em caso de o período de governos progressistas ter sido utilizado estrategicamente para tanto. E é óbvio que não o foi e por isso ninguém estranhou a apatia, porque no fundo o levante nunca foi estabelecido como contraponto natural a incursão que a burguesia promovia contra o estado brasileiro.
Quando pensamos em formular uma estratégia revolucionária que passa pela disputa eleitoral que se avizinha, derrotar o fascismo toma posição importante, mas secundária para empreender os objetivos da esquerda. Da mesma maneira, a própria candidatura Lula/Alckmin que per si, novamente, eleva a temperatura do tensionamento entre as classes sociais apenas por indicar novo período reformista, não é tratada como fim da história e nem um possível governo progressista terá como papel central da esquerda a limitada ação de lutas por mais reformas.
A tarefa da esquerda deve ser orientada para a revolução e, talvez, vencidas as eleições e mobilizado o povo em defesa de seus diretos, permanentemente sendo conscientizado de sua força para ir além de reformas capitalistas, daqui há algum tempo, quando eles anunciarem o golpe, a esquerda poderá consumar a revolução e enfim tornar o Brasil dos sonhos dos socialistas portugueses, pois, dos pares franceses esse país já o é.
RECOMENDAÇÃO DO SBP
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